Mulher agredida em show de “O Poeta” em Pojuca-BA/outubro de 2019 (arquivo)
Um dos blocos a desfilar no circuito “Ivete Sangalo”, o oficial do Carnaval de Juazeiro 2020, na noite de sexta feira (7), primeiro dia de festa, será o “Respeite As Minas”, que faz um alerta às práticas de violência contra as mulheres, tão comuns em festas populares, e combate o assédio sexual e a desqualificação da mulher.
Um apelo louvável, mas de uma contradição sem igual, considerando o carnaval da minha cidade. No mesmo circuito, após o cortejo do bloco que pede respeito às mulheres, a atração de um bloco particular traz em seu trio um sujeito conhecido como “O Poeta”, que gritará um repertório machista, sexista, violento, pornográfico, com coisas do tipo:
“Só porque tu é feinha pensa que eu não meto vara
Mulher tu tá enganada, mulher tu tá enganada, bebê
Vem com o poeta que comigo é sem cutcharra
Saco de pão na cara, saco de pão na cara
Saco de pão na cara, aí droga”.
Que droga de poeta! Que droga de atração que será paga por mulheres, novinhas e todas as idades, e homens (filhos, pais e irmãos de mulheres) que correrão atrás do trio de um “cantor” que violenta as minas, sem pudor, sem freio, e em uma festa bancada com recursos públicos.
Sim, uma festa pública! E não venham me dizer que a atração é de um bloco particular e a gestão nada tem a ver com isso. Indiretamente, tem sim! Tem recurso público investido no carnaval de Juazeiro. Dinheiro que sai do meu bolso de contribuinte, do seu bolso, munícipe. Na publicidade da festa (que consta o nome desta atração infeliz) tem dinheiro público; na iluminação da avenida que “o poeta” desfilará também tem dinheiro nosso; na diária dos policiais e demais agentes públicos que trabalharão para a segurança e bem estar dos foliões que assistirão ao show bizarro, de mensagens que achincalham a mulher, tem dinheiro público. Da ornamentação da festa, as “camisinhas” que serão distribuídas, tem dinheiro do povo.
Não, não me venham falar em censura, pelo amor do guarda! Liberdade de expressão para fazer apologia à violência contra as mulheres e enaltecer ladrão que deixa a mulher careca?
“Maloqueira é destemida fechamento com o ladrão. Tá sempre lado a lado, é pura disposição. Tu tá chegando agora já quer bancar de esperta
Não guenta ver o playboy que tu já quer dar a pepeca. Ou mulher, oh! Tu fica esperta. Se trair o ladrão, tu vai ficar careca. Vai ficar careca, vai ficar careca. Se trair o ladrão, tu vai ficar careca. Chaque, chaque chaque. Tá ligado que a tesoura bate”, diz outra “letra”.
Querem mais baixaria? Pois tomem, tomem:
“Fodão é o caralho
Preste atenção no que eu vou lhe dizer
Hoje tu goza pelo telefone
Segue o passo a passo que eu dou pra você
Primeiro, vai tirando a roupa
Imagine eu te beijando
Mordendo o teu pescoço
Os teus seios vou mamando
Passando a minha língua da barriga pra virilha
Chupando a tua pepeca aumentando tua adrenalina
Vou subindo te linguando toda
Chego no ouvido e te faço a proposta
O que você tem pra me oferecer?
Deixa eu botar sua gostosa, deixa deixa
Deixa eu botar sua gostosa”.
E tomem, e tomem mais. Tomem soco na cara!
“Já tomou murrinho, gostou
Pediu de novo
Já tomou murrinho, gostou
Pediu de novo
Falou pra sua amiga que o Poeta fez gostoso
Contou pras amiguinhas que o Poeta é o mais gostoso
Oh, sua amiga, tá me pedindo pouco
Sua amiguinha também tá querendo pouco
Toma soco
Toma soco
Toma toma
Toma soco”
As músicas do Igor Kannário, alvo de um ofício enviado por três conselhos municipais à coordenação do carnaval e ao gestor municipal, com pedido de cancelamento por fazer apologia à violência, são “canções de ninar” diante de tamanha brutalidade e baixaria executada pelo tal ” o poeta” (que bem me parece um transtornado sexual, que necessita urgente de tratamento psiquiátrico).
E por falar em baixaria, como o Ministério Público interpreta a Lei Municipal n° 2.707/2017, mais conhecida como Lei Antibaixaria? A lei que veda a contratação de artistas com “músicas, danças ou coreografias” que incentivem a violência, utilizando dinheiro público para efetuar o pagamento dos cachês?
O “Principe do Gueto” (que reside no luxuoso Condomínio Alphaville), vai gritar lá de cima que “Quando eu era moleque, Eu andava na rua imbecado. Usava uma Kenner e um cap. Andava desacreditado, agora não sou mais moleque. Vou botar o bagulho pra virar. Vou botar pra acreditar. Eles me comediaram. É um monte de otário! Uh! uh! uh! uh! uh! Uh! uh! uh! uh! Uh! Eu vou pegar os caras!Eles não são de nada! O Kannário, vai pegar os caras!”
Esses versos tão incitantes, podem inspirar uma bagaceira na avenida. A Polícia que se cuide, e as “galeras” também.
Também, muitíssimo bem pago, e com recurso público, será o “gigante” Léo Santana, que também tem um repertório deplorável. Pela lei, ele seria multado em 50% do valor total do cachê, se cantar:
“Com a garrafa de whisky a santinha (desce) Com a garrafa de tequila, a santinha (desce)
Se acabou a bebida a santinha (para)
Abastece que ela desce
De-desce, de-desce, desce.
De-desce, de-desce, desce
De-desce, de-desce, desce”.
Quem fiscalizará o gigante e os demais que vão mandar as novinhas encherem a cara e descerem, entre outras coisitas mais?
Não me venham falar também em caretice. É a minha condição de mulher que está sendo atacada. E a de minhas filhas, das minhas amigas e suas filhas também, das mulheres pelas quais eu tenho dedicado a vida no combate à objetificação, ao desrespeito, à violência cotidiana que sofremos.
Fico pensando… Será que o machismo está vencendo? O bloco que contratou “o poeta” nos informou que colocará cerca de 1.500 foliões na avenida, e cada um paga pelo abadá, 60 reais. Milhares de foliões assistirão ao “espetáculo” de espancamento moral à mulher, e também, indiretamente, irão pagar por isso. Uns dançando, outras descendo até o chão e lá deixando a dignidade humana, outros repetindo o refrão “Toma soco, toma soco”.
Toma soco, mulherada!
E eu, com um fiozinho de voz, repito: Respeitem as Minas!
Sibelle Fonseca é radialista, militante do jornalismo, pedagoga, feminista, conselheira da mulher, mãe de quatro filhos, cantora nas horas mais prazerosas, defensora dos direitos humanos e uma amante da vida e de gente.
Uuffaaaa!!!! Que alívioooo!!! Uma voz sana se levanta diante desse desrespeito legitimado e bancado e/ou apoiado pelo poder público.
Obrigada, Sibelle por fazer valer esse grito!!
É, no mínimo, inadimissível que aceitemos, pasmas e inertes, a propagação desses discursos sexistas, misóginos e violentos contra a existência das mulheres. Vale tudo mesmo em nome da “liberdade” de “curtir o carnaval”??
O mais triste de tudo isso, é que a maioria da mulherada gosta aplaude infelizmente.
É tudo tão absurdo que eu tive que procurar no YouTube pra confirmar e são reais todas essas letras! Juazeiro tá de parabéns, hein?!
Como homem (filho, sobrinho, primo, irmão, tio pai, namorado, amigo e professor) de mulheres , me sinto ultrajado com esse tipo de “arte”, ao qual repudio. Concordo com a reflexão da jornalista e colega e acho, inclusive, que o Ministério Público ou outro ente público deveria promover uma campanha de repúdio e rejeição social a esse tipo de “arte” que inclusive questione a impostura de mulheres que, talvez sem perceber, reforçam o discurso e a prática da violência que as vitima quando dançam essas “canções” em casa, em festas, na praia, na avenida…
Encontrar o ponto de equilíbrio entre liberdade de expressão e o mínimo de cuidado com a geração, reprodução e disseminação de práticas e idéias tóxicas para a vida em sociedade é um desafio que precisa ser enfrentado. Necessariamente é preciso ter princípios básicos de não violência, não descriminação, de não dominação. Talvez não controlar conteúdos, mas local de reprodução e responsabilizar por eventos resultantes.
Condeno veementemente pessoas que se dizem cantores e ou poetas que insultam e destroem a dgnidsde da mulher dessa forma, o pior sendo contratado pelo poder público pessoas como essas ja que me recuso a chamalos de “atração” que incentivam também a violência. Mas ainda me coloco a pensar! São contratados porque parte das mulheres gostam de serem tratadas assim, pois como no próprio texto diz elas vão atrás do trio dançando essas mesmas musicas.
Relativismo ético e engajamento partidário na tentativa de desviar foco e proteger a prefeitura.
Nem Kanario, nem Poeta.
Carnaval é a festa da carne, queremos mais cultura no nosso pais mas paramos pra ver bundas rebolando e jogadores ganhando milhões correndo atrás de uma bola, me entristece saber que esse governo pão e circo deixa milhões de brasileiros sem aparo devidos pois somos o pais que mais pagamos impostos, mas também digo consciente que nós que procuremos estudar e não cair do céu, solução? Eu amo de verdade minha pátria mas o que vejo hoje são os aeroportos, a cultura da capoeira que eu prego é mais valoriza lá fora que aqui dentro, em Novembro minhas bagagens estão prontas que os espanhóis me esperem para conhecer a cultura afro-brasileira, Sibelle minha linda agradeço você por tudo por “explanar” ideias tão contundentes!
é só ficar em casa e deixar a gente se divertir
Texto muito coerente, é muita hipocrisia por parte do poder municipal.
Sempre apoiei, mas chega um momento que você percebe que não dar mais.
Me sinto extremamente enganado como cidadão.
Lamentável
Texo bem elaborado e contundente com a realidade. Quero ver é se uma mulher da família destes cantadores fossem agredidas ou abusadas por conta destas bestiais letras, se eles continuariam cantando. Isso é uma falta de criatividade, falta de respeito. Queria ver se as mães, irmãs, primas, namoradas ou esposas deles sofressem as agressões das quais instigam a multidão a fazer.
Quem devia ficar em casa e de preferência de boca fechada é esse “poeta” de merda e deixar que todos se divirtam com dignidade e alegria que uma festa como o carnaval merece. Vamos ampliar a voz sensata de Sibelle!
Sibele Fonseca obrigada por se posicionar com esse texto intensamente representativo.
Que vergonha desse tipo de “homem” que são esses “cantores”. E a população aceitar isso aí, inclusive muitas mulheres!! Triste!! Juazeiro tá de parabéns!
Se for para proibir músicas indecentes e insanas, é melhor acabar com o Carnaval!
Meu cabelo duro é assim….
É uma vergonha!
Pra mim isso não é cantor e o gestor deveria não trazer atrações desse nível.
Decepcionada!
Excelente defesa da dignidade feminina, Sibele! De poesia não há nada, Poeta, e sim, muita agressão à mulher. A rua precisa ceder espaço para quem sabe respeitar.
Nada a ver, citar a música santinha de Léo Santana e proibir o mesmo de fazer o seu trabalho. Se não queriam a atração, então pra que contratou? Pq o povo gosta e quem não gosta é só não ir… Ninguém é obrigada a beber e descer até o chão, a não ser que ela queira! Pois, mulher independente bebe se ela quiser, Pq ela tem dinheiro pra pagar…Hipocrisia e falso moralismo, tanta coisa pior pra se preocupar na Cidade de Juazeiro-BA!
Não se tem mas carnaval como antigamente triste realidade
“Respeita as Minas” depois de permitir uma atração desse nível?? Só pode ser uma piada… Que lamentável esse carnaval de Juazeiro! A Bahia tem tantas atrações boas! E não venham me dizer que o povo só gosta de baixaria. Enquanto o poder público for conivente com esse tipo de apresentaçao, mesmo em blocos particulares, não adianta discursar contra nenhuma forma de violência. O contexto da festa já tomou esse rumo.
Tenho é nojo dessas bandas com letras machistas, ainda fazendo apologia a violência com mulheres. Como é que os organizadores contrata uma banda dessa. “O poeta” que só canta baixaria. #nojo
Tem publico cativo, tem quem defefenda, e conta com certo orgulho o “pau” que tomou do seu homem! Não dá pra entender, mas é assim que funciona.
Não me representa! Portanto esse “poeta” não pode ser bancado com dinheiro público.
Foi em pojuca rpz
querem acabar com carnaval de juazeiro !!!
Uma mulher foi agredida com um chute no rosto enquanto estava dançando no palco durante show do cantor de pagode conhecido como “O Poeta” na cidade de Pojuca, na região metropolitana de Salvador, no domingo (27).
Vídeos feitos por outras pessoas que acompanhavam a festa, e divulgados nas redes sociais, mostram o momento da agressão, ocorrida dentro da casa de shows Clube AIP. Jhon Santana, um dos produtores da festa, disse ao G1 que o agressor, que não teve identidade divulgada, seria namorado da vítima.
Bom desabafo Sibele, sou Cristã e nunca concordei com o canaval mas sempre respeitei como sou obrigada,ate por que o dinheiro do carnaval serve para outras coisas mais uteis, mas quero falar desse poste seu, realmente isso é horrível onde se tem varias campanhas de violência contra a mulher, arrasada estou, com essa situação lamentável isso,e o próprio poder publico incentivar é mas lamentável ainda, violência contra a mulher isso é inaceitável.
Tamos juntas, Sibelle Fonseca! Concordo com o seu artigo. Avisei às Conselheiras da Mulher, que nossas solicitações não teriam efeito algum…Assim foi também no ano passado. Fica a dica: Sentar com o Executivo e Legislativo, aproveitar seu artigo e pensar melhor para o proximo ano. Assim o trabalho que densenvolve toda REDE DE PROTEÇÃO À MULHER DE JUAZEIRO, durante todo o ano venha a ser RESPEITADO!