
Em sua nova fase iniciada em 1985, já sob a direção de Luciano Barbosa, O Sertão surgiu com novo planejamento gráfico e equipe profissional, sendo Cid Carvalho reverenciado como fundador. Comparando a capa da última edição que o circulou em 1972 e a primeira edição da nova fase, percebe-se a evolução gráfica neste período. Na
fase anterior, o jornal utilizava ilustração, agora dispõe de fotografias, além de o layout apresentar manchetes, intertítulos e infográficos. É inovador neste sentido. O jornal ressurgiu com características semelhantes aos jornais atuais, chamadas com fontes em destaque e disposição harmônica de texto e fotografia.
Na primeira edição de O Sertão já se comprova a influência econômica, política, social e editorial da família Coelho sobre o periódico, há publicidade de empresas dirigidas por membros da família e notícias de política exaltando a herança familiar. Essa influência do patriarcado Coelho nos meios de comunicação se iniciou com a fundação
de O Trabalho, em 1912, O Sertão, em 1945, e a implantação das emissoras Grande Rio Am e Fm, e, posteriormente, com a criação da TV Grande Rio, em 1º de junho de 1991, afiliada à Rede Globo e marco para o desenvolvimento dos meios de comunicação em Petrolina.
Na edição de relançamento de O Sertão, em 8 de fevereiro de 1985, verificou-se um fac-símile de uma edição que circulara em 1972, em que se comprova que o diretor responsável era Geraldo de Souza Coelho, empresário e que exerceu cargos políticos como prefeito, deputado estadual e federal.
Na edição do ano de 1972, o jornal se intitulava como “Órgão noticioso e cultural”. Com a nova fase, surgiu como “um órgão vibrante, adulto, verdadeiro”. Percebe-se, portanto, o tom ufanista que caracteriza o jornal em relação à política local e à cidade de Petrolina. Ao anunciar a sua chegada, faz referência ao último ano em que circulou O
Sertão:
“A ausência desses 13 anos não conseguiu reprimir o desejo de voltar. Hoje, O Sertão está de volta. Moderno, vibrante, adulto, verdadeiro. Estamos chegando. Desta vez para ficar. Dispostos para contar a história de um novo tempo”.
O periódico, com sua linha editorial específica, cumpriu seu propósito de contar a história de seu tempo, como se comprova nas suas 29 edições, publicadas de 8 de fevereiro a 25 de dezembro de 1985. Em média, o periódico circulou com oito a 16 páginas. O jornal é eminentemente político, no entanto, abordou também o desenvolvimentismo presente no Vale do São Francisco, com especial ênfase para Petrolina. Notícias sobre
irrigação e agricultura eram constantes devido à cidade ser um pólo de fruticultura irrigada.
Na edição do dia 19 de março de 1985, a página de opinião trazia manchetes como “Racionalização do Crédito Agrícola”, de autoria de Valdenor Ramos, economista e professor universitário, e em 4 de abril de 1985, o autor volta a temática, discutindo: “Racionalização do Crédito Rural”; além de trazer a notícia “Crédito Rural: BNB volta
a operar”. O assunto, tanto nos textos de opinião como nas notícias, mostrava como era possível conseguir crédito e financiamento para empreender a irrigação em ascensão no Vale do São Francisco.
O jornal também procurava divulgar os acontecimentos da esfera educacional como na manchete da edição de 19 de julho de 1985: “Famesf pode ser extinta”. A notícia dizia que a Faculdade de Agronomia do Médio São Francisco, hoje ligada a Universidade do Estado da Bahia, poderia desaparecer para dar lugar a um centro somente de pesquisas, o que não se concretizou, já que, em 2010, a Famesf completou 50 anos e é referência
em formação de agrônomos e em pesquisa de ponta na área de agronomia.
Os anúncios publicitários no jornal eram, em sua maioria, de órgãos públicos oficiais como Prefeituras de Juazeiro e Petrolina, Governo de Pernambuco e Bancos Estatais, além de empresas ligadas a membros da família Coelho.
Nas primeiras edições, o jornal O Sertão exaltou os feitos da família Coelho. Esta afirmação se evidencia, quando em uma das manchetes de capa da edição nº 1 de 8 de fevereiro, afirmava: “Prefeito diz o que fez por Petrolina”, referindo-se a uma coletiva do prefeito Augusto Coelho aos meios de comunicação, como Emissora Rural, o jornal
O Pharol, rádio Grande Rio, além de O Sertão. O texto se aproxima do formato dos releases de assessoria atuais enviados pela administração. Identifica-se o tom oficioso, o engrandecimento dos feitos da prefeitura e as promessas do que a administração pública poderia vir a fazer.
De orientação política definida e com posicionamento liberal não se vê em O Sertão a efetiva participação de populares, existe um silenciamento sobre movimentos sociais e não há presença de fontes ligadas ao sindicalismo nas edições analisadas. O jornal parecia não abordar aspectos do jornalismo cidadão nem conceder espaço às vozes das classes trabalhadoras, justamente porque os definidores primários (fontes com alianças com o poder político e econômico local) exerciam poder sobre os gatekeepers e influenciavam a linha editorial.
Realizando o inventário do periódico, pode-se ler que, na página três das edições analisadas, havia geralmente a Coluna Assino Embaixo, escrita por Luciano Barbosa, o Editorial e dois artigos assinados. Neste sentido, O Sertão foi pioneiro em trazer diversas visões nos artigos, já que, no período esta prática não era presente nos periódicos do início do século, que circularam na região.
No entanto, apresentava discurso conservador como é demonstrado em uma nota da Coluna Assino Embaixo de 19 de julho de 1985: “Proliferação de Partidos, O Brasil que já passou muito tempo apenas com dois partidos políticos, já conta com 23 e, segundo se propala terá brevemente o 24º. Como existe o PC e o PC do B, é possível que surja
o PC do Gay, abrigando muitas “bonecas”, inclusive sertanejas…”
Luciano veiculava uma visão pejorativa dos partidos comunistas como demonstra o texto. Nesta nota da coluna, percebe-se um olhar conservador do autor sobre a discussão de gênero, associando os partidos comunistas a partidos de forte influência gay e denotando uma carga preconceituosa, tanto política quanto de orientação sexual.
Em meio ao tom oficioso que caracterizava o jornal, destaca-se a coluna Letras e Artes, assinada por Elisabet Gonçalves Moreira, professora universitária e militante do movimento feminista à época. A coluna se propunha a discutir a literatura, como anunciou a própria colunista na primeira edição: “(…) tem a intenção de despir-se de falsos ornamentos, de cantadas bajulativas, de coerções, mesmo nesse difícil campo da arte. A intenção, essa sim, de uma linguagem democrática, procurando no bom senso e nos limites do artístico os critérios de seleção (deveria tê-
los?) para bem informar.”
Ao lado da coluna Letras e Artes, Maria Therezza assinava a coluna Socialit, um espelho da sociedade petrolinense mais abastada. O futebol aparece modestamente no jornal, geralmente na última página, dividindo seu espaço com notícias de cunho policial. Embora tenha se proposto a ser um jornal perene, O Sertão não conseguiu cumprir seu objetivo de “chegar para ficar”, e foi extinto. Hoje, os únicos jornais que circulam na cidade são Gazzeta do São Francisco, criado em 1997, e Folha do São Francisco, lançado recentemente. Durante o período da pesquisa não se conseguiu obter dados que evidenciem quando o jornal circulou pela última vez.
Por Juliano Ferreira