“Sempre aos Domingos”, por Sibelle Fonseca: As mulheres são assim, diferentes e tão iguais – uma deliciosa e louca contradição

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“Sempre aos Domingos”, uma coluna assinada por Sibelle Fonseca, editora do Portal Preto No Branco, estreia hoje (24), trazendo crônicas sobre vida, comportamento, relacionamentos, sentimentos, pensamentos e tudo mais que cerca a realidade humana. São textos autorais baseados em um olhar mais introspectivo e nas experiências vividas. Uma espécie de jornalismo literário, não-ficcional, ficcional, de temas livres. A realidade humana pelo viés da literatura. Buscando a profundidade.

Acompanhe a primeira crônica da série:

As mulheres são assim, diferentes e tão iguais – uma deliciosa e louca contradição. 

Uma amiga, mulher já com mais anos, jovial e muito interessante, passou um dia de sábado esperando o moço de uns menos 20 do que ela, pelo qual estava interessada, após um breve esbarrão destes que a vida adora brincar, ligar para ela, conforme combinado no dia anterior. Ou melhor, na madrugada anterior, quando o clima que havia no ar, esquentou e foi dada a largada para a expectativa.

Foi um sábado especial para ela. O coração não parou um só instante porque estava parado nele, o seu objeto de desejo, necessidade ou idealização, vai saber… Ela olhou o último visto do Whatsapp a cada centena de fração de segundos; duvidou que ele desse retorno, mas logo viu na sua tela mental os dois juntos logo mais à noite. Pensou na roupa e higiene íntimas, no perfume mais bacana que tinha, nas posições possíveis, na idade, na flacidez dos seios, nas dobras a mais, na idade de menos, no tesão que sentia só de pensar, no cabelo, na unha, no pé, na timidez que teria que enfrentar, na cumplicidade que certamente teriam, no papo bom que ela iria jogar na cama depois de tudo, na sua sabedoria afrodisíaca, na roupa mais sedutora, no batom, na bebida que a deixaria mais solta, na fumaça que ativaria os sentidos, no lugar, no lençol, se dormiriam de conchinha ou saltariam da cama logo depois, o que pré estabeleceriam como liminares, via que estava escrito nas estrelas, dizia pra si mesmo que era uma louca, lembrava da menopausa, mas sentia uma adolescência latente, sorria sozinha. O coração apertava pelo medo da rejeição, se condenava, se absolvia, se sentia fácil e a ele dava superioridade. Se fazia de difícil e a somente a ele concedia a iniciativa de tomar a decisão de ligar, de dizer sim ou não, de querer, de desejar…

O sábado não terminou bem para ela, mas foi especial. Ele não deu sinal. Num dia só foram muitos sentimentos e emoções, mas a palavra final não veio. A expectativa não fez gol e ela, frustrada, acha que não jogou bem. Assim são as mulheres. Elas são diferentes.

O sábado dele foi normal. Deu conta do que tinha pra fazer, certamente. Lembrou dela algumas vezes e deu um sorriso de canto de boca. Era uma possibilidade que qualquer dia poderia acontecer. Pensou o quão interessante era ela e quão disponível também. Não ligou, nem escreveu nada, pra não se comprometer e nem ter que decidir por um sim ou por um não, mesmo que por uma noite. “Deixa acontecer”, concluiu ele e findou o sábado sabe se lá como. Assim são os homens. Eles são diferentes.

Ela esperou até ficar tarde demais pra sentir o impossível – ele não ligaria mais uma hora daquela. Foi dormir pensando ainda mais em si.

Mas antes disso, queixou-se para mim, usando uma frase de Raul que eu adoro cantar: “Confesso abestalhada que eu estou decepcionada”. E eu só pude lhe dizer: “Não se aborreça com isso. Dê risada. Primeiro dele, que deixou de estar com uma mulher especial como você. Depois ria pra você mesma, porque ainda conserva a alma de menina, apesar dos danos. Uma menina que se apaixona, encanta, tem brilho no olho, coração bobo, hormônios teimosos, tesão e ainda acredita, aposta, espera e sonha. Vá dormir, mulher! E aprenda: a expectativa usa o mesmo uniforme da frustração. Da próxima vez, espere de novo para alcançar ou para se frustrar, quem sabe? Se a vida não fosse feita de esperas, não haveria encontros e nem desencontros. Não haveria graça. Mas saiba que a grande graça da vida mora em você mesma. Então espere-se, encontre-se e esperance-se sempre”, aconselhei minha amiga como se aconselhasse a mim mesma.

É, as mulheres são assim, diferentes e tão iguais – uma deliciosa e louca contradição.

Sibelle Fonseca é radialista, militante do jornalismo, pedagoga, feminista, conselheira da mulher, mãe de quatro filhos, cantora nas horas mais prazerosas, defensora dos direitos humanos e uma amante da vida e de gente.

2 COMENTÁRIOS

  1. Adorei Sibelle, texto muito sensível e de uma força que encanta, não sei se pela sinceridade das linhas ou pela competência da escrita. Se, talvez, ela houvesse ligado, se talvez houvesse acontecido o esperado poderia ser frustrante em razão da expectativa talvez não alcançada, o que fica, decerto, é esse prazer bom da espera, da confabulação e do sonho, pois se a paixão é como o tempo, que tudo arrasta, avassaladora, o amor se apresenta primeiro de forma platônica, abraços.

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