Muito temos ouvido sobre a importância do auto cuidado. E as dicas são as mais variadas e todas válidas. Coisas do tipo: foque em você; faça atividade física e exames médicos; faça terapia, massagem; tenha uma alimentação saudável; não fume e não beba; vá ao médico e viaje. Outros apelos veem da lógica do mercado e, sem querer aprofundar, cito alguns bem rasos: Faça um procedimento estético, implante unhas e cílios, implantes lentes nos dentes e nos olhos; compre roupas, relógios, sapatos, Iphones, coisas e mais coisas, porque você merece! Primeiro você, segundo você e terceiro você!
Tomei por bem acrescentar mais uma destas dicas de auto cuidado. Eis que digo: Cuide do outro. Esta é uma forma infalível de auto cuidado. Tenho já bons anos vividos e muita autoridade para lhes dá essa garantia.
Cuidar do outro é assegurar que está se cuidando. É auto proteção. É prevenção para as horas de apuros. Poderoso elixir para prevenir as dores do envelhecer. Procedimento cirúrgico que nos salva nas dificuldades da vida. Fórmula mágica para nos mantermos produtivos, interessantes, amparados, bem sucedidos e felizes. Porque é da natureza devolver o que se dá. E em algum momento precisaremos de cuidado seja de um amigo, seja de um estranho. Daquele próximo não tão próximo.
Vou ilustrar aqui com dois exemplos. Outro dia uma minha seguidora deixou uma mensagem no privado, que me tocou muito. Uma mulher cega desde menina. Ela contava que estudou comigo no primário e eu a ajudava copiando, em seu caderno, os pontos que a professora escrevia no quadro de giz. Escrevia no meu e no dela. Ela me agradecia por cuidar dela e ajudá-la a acompanhar as aulas. Pois bem, no mesmo instante lembrei de uma colega do meu filho que, ainda na faculdade, iniciou um processo de cegueira e ela, pacientemente, copiava os conteúdos da lousa. Ela cuidou do meu filho naquele momento de dificuldade, cuidando de mim por conseguinte. Ele se formou e eu não sei o nome dela para agradece-la. Não me perdoo por isso.
Por estes dias, eu agradecia a Niltinho, um querido que todos os dias ouve um áudio do meu filho citando os times para um jogo de aposta. Após o almoço, eu gravo o áudio e envio para Niltinho, nosso “Niltin”. Confesso que não entendo quase nada do que meu filho diz, pois além de não entender nada de futebol (e é impressionante o quanto ele entende), admito que a fala é quase inaudível. Mas Niltinho ouve, faz o jogo, manda o comprovante certinho e paga o valor da aposta (meu filho ganha frequentemente).
Agradeci a meu querido Niltinho pela generosidade, empatia e pela sua paciência com meu filho, que tem neste jogo sua maior diversão. Ele que tem tantas limitações nesta vida. Agradeci lembrando de um ouvinte meu. Seu José Balbino, que há anos me liga para conversar, reclamar das coisas do seu bairro, pedir alguma ajuda. Ele sofreu um derrame e fala com extrema dificuldade. Eu escuto seu Balbino mais com o coração e faço de tudo para entender o que ele diz. Dou-lhe o cuidado da escuta, assim como Niltinho faz com meu filho, e por conseguinte a mim. Já ouvi de um colega de rádio: “Vai botar seu Balbino no ar?” Ninguém vai entender nada que ele diz”. Ao que eu respondo: “Mas é claro! A deficiência é de quem não entendê-lo!”. E ele fala, e é ouvido!
Percebam aí, somente nestas duas situações, o quanto o cuidar do outro é auto cuidado. Eu poderia aqui enumerar diversos outros exemplos do quanto cuidar dos outros é cuidar de si. Seja dando escuta, olhar, dando a mão, o ombro, facilitando de alguma forma, abrindo portas, dando afeto, atenção, alguma palavra de esperança e fé.
Sim, foque em você. Faça o que for para se sentir feliz, seja uma plástica ou um guarda roupa novo, mas cuide-se cuidando de quem chega até você. Juro que esta é a maior garantia de auto cuidado. Ainda que a vida, essa aventureira de nós, não nos dê lá muitas garantias.
Sibelle Fonseca é editora do PNB, radialista, militante do jornalismo, pedagoga, feminista, mãe de Carla, Pingo, Mariana e Ananda, tem filhos de 4 patas, cantora nas horas mais prazerosas, defensora dos direitos humanos e animais. Uma amante da vida e de gente.