Sem discutir com a sociedade, ambientalistas e movimentos sociais ligados à defesa do meio ambiente, a gestão Suzana Ramos pretende estabelecer mudanças na delimitação da Área de Preservação Permanente – APP, em Juazeiro, Norte da Bahia, através de um Projeto de Lei. Com o PL, o Executivo visa estabelecer no Perímetro Urbano do município uma delimitação da APP.
O PL deverá ser enviado à Câmara de Vereadores, mas a data para votação ainda não foi divulgada. Segundo informações extraoficiais, a votação pode acontecer nesta quarta-feira (14), às 15 horas.
Sobre o assunto, o Portal Preto No Branco ouviu o ambientalista Roberto Malvezzi, Gogó, que tem vasta experiência de vida no Semiárido Brasileiro e estudioso do Rio São Francisco, com atuação na Equipe CPP/CPT do São Francisco.
Após analisar o PL, Malvezzi avaliou: “O que eu consigo observar, coloco em 3 pontos básicos: Primeiro, o PL visa consolidar essas áreas que seriam de preservação permanente, mas que já foram ocupadas pelo próprio processo histórico de Juazeiro. São três áreas basicamente. A área do Rodeadouro, chamada de área urbana, a área centro da cidade de Juazeiro e a área 3, chamada de Mariad. Então, já teríamos ocupações desses espaços que seriam fora da lei, mas que este Projeto de Lei vai reconhecer, consolidar porque na opinião da prefeita essas áreas seriam irreversivelmente ocupadas. Não adiantaria você manter uma lei e essas situações concretas, já citadas, ficariam fora da lei. Mas acontece que a questão da mudança na Área de Preservação Permanente vem sofrendo encolhimentos seguidos no Brasil. A área de preservação das margens do Rio São Francisco, já foi de 500 metros, passou para 100 metros e agora tem áreas aí no PL que se fala em 15 metros. E nós sabemos que o Rio São Francisco tem apenas 5% das suas matas ciliares e esse é colocado como um dos problemas mais graves que tem o Rio São Francisco, ou seja, a falta das proteções naturais vegetais das suas matas ciliares. Uma destruição que teria começado lá atrás, principalmente com a madeira retirada para alimentar os vapores já que eles eram movidos a lenha e a madeira era mais fácil, mais próxima, mais barata, estando ao alcance dos vapores”.
O ambientalista considerou ainda que: “O segundo ponto, que eu acho que precisaria prestar atenção é o artigo III do Projeto de Lei que chega a afirmar textualmente que não serão liberadas construções de novas áreas que não estejam no limite dos 100 metros. Tenho duas dúvidas: A primeira é exatamente essa lei municipal que contraria a lei maior, do Código Florestal, e de outras leis ambientais, inclusive a própria Constituição Federal em alguns pontos ou em algum. Se a lei municipal contrariar alguma lei maior, ela será facilmente anulada a posteriori, caso alguém decida recorrer pelas suas ilegalidades e inconstitucionalidades. Mas eu não sou da área jurídica e imagino que o Ministério Público deva examinar isso. Imagino que gente da OAB, que os movimentos populares vão examinar essa legislação municipal à luz de outras leis para ver se ela é pertinente ou se ela é inconstitucional”.
Gogó avaliou ainda a questão política que o PL traz: “A segunda questão é mais de ordem mesmo política, pois nós sabemos que sobretudo no Rodeadouro ou no centro urbano de Juazeiro essas Áreas de Preservação Permanente vem sendo ocupadas pelas construtoras de condomínios de habitação, condomínios de luxo, muitas vezes resorts e então fica a pergunta: Realmente daqui para frente essas construções vão estar vetadas de serem construídas em outros lugares ou a lei deixa brechas para que novamente outras iniciativas tomem conta desses espaços? Veja que isso é uma questão política já que a lei é municipal e ao fazer uma lei municipal, evidentemente, ela pode estar sujeita a novas mudanças no futuro. Outra observação que faço em relação a este PL, é que quando se infringe uma lei, o que vem é uma punição para os infratores. Neste caso, está se criando uma lei para beneficiar os infratores, o que é também uma decisão política”.
O ambientalista concluiu reforçando a necessidade de uma ampla discussão sobre o tema, o que também defendem outros ambientalistas e movimentos ligados à defesa do meio ambiente, em Juazeiro.
“Deveria existir um debate, pois o assunto é do interesse da população de Juazeiro e de todos os cidadãos de Juazeiro. Também do ponto de vista dessa luta sócio ambiental que se faz no Brasil inteiro pela preservação dos nossos rios e das Áreas de Preservação Permanente”, finalizou.
Manifestação da Prefeitura de Juazeiro
Em nota enviada ao PNB, a Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (SEMAURB) esclareceu “que o Projeto de Lei (PL) em questão tem como objetivo regulamentar apenas as áreas urbanas consolidadas do município localizadas em Área de Preservação Permanente (APP), e não abrange toda a margem do Rio São Francisco”.
A PMJ ressaltou ainda que “a referida lei é uma medida para promover um desenvolvimento ordenado da cidade, uma vez que qualquer solicitação de intervenção nessa área específica será submetida à análise e apreciação do Conselho Municipal de Meio Ambiente, por meio do processo de Licenciamento Ambiental. A iniciativa do PL está respaldada pela Lei Federal 14285/2021, que concede autonomia aos municípios para legislar sobre o tema tendo como foco principal coibir o crescimento desordenado nas faixas de APP, desrespeitando os 500 metros estabelecidos pelo Código Florestal”, finalizou a nota.
Redação PNB