Preto no Branco: um jornalismo feminino que empreende, resiste e transforma

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Numa esquina modesta de Juazeiro (BA), entre casas simples e demandas urgentes, pulsa um jornalismo que incomoda. Feito por mulheres, para a comunidade, com coragem de enfrentar quem prefere o silêncio. É ali que o Preto no Branco, há nove anos, transforma denúncia em resposta e palavra em ação.

“Se o Preto no Branco fosse um corpo, as partes mais sensíveis seriam os braços e as pernas, porque a gente não consegue alcançar todas as pautas que gostaria. Mas o coração pulsa forte. E pulsa cada vez mais.”

A fala é da jornalista Sibelle Fonseca, fundadora do portal Preto no Branco, sediado em Juazeiro, no Norte da Bahia. Em uma cidade onde a imprensa local ainda é marcada por coberturas institucionais e dependência política, o portal se consolidou como um espaço independente, autoral, comunitário e feminino. Criado por duas mulheres, com estrutura mínima, o Preto no Branco se tornou referência no Vale do São Francisco como exemplo de resistência, inovação e compromisso com as vozes silenciadas da região.

Um propósito que virou portal

Depois de 27 anos de profissão e uma temporada no estado de Sergipe, Sibelle voltou a Juazeiro com um incômodo claro: “Senti a necessidade de entrar nesse mundo virtual, montando um blog diferenciado, com pautas mais comunitárias e autorais”. Ao lado da jornalista recém-formada Yonara Santos, que viria a se tornar cofundadora do portal e uma das principais responsáveis pela produção editorial, ela criou o projeto com o objetivo de romper com o jornalismo baseado em releases e se aproximar das realidades do povo juazeirense.

Yonara, ainda em início de carreira, aceitou o convite pela identificação com o propósito:

“A minha maior motivação foi a proposta de fazer um jornalismo comunitário, com propósito e próximo dos problemas da comunidade.”

Na prática, a parceria foi imediata: “Como eu já tinha alguma experiência em outro portal, pude contribuir no formato e na periodicidade das publicações”, relembra.

A força do projeto, no entanto, não está apenas na figura de Sibelle, mas na construção coletiva com Yonara Santos e na atuação de jovens comunicadores que seguem se formando dentro da redação.

Jornalismo que incomoda — e transforma

“Fazer jornalismo independente tem um custo. E um dos custos são as pressões, as tentativas de silenciamento. A gente não foge disso. A gente sabe que incomoda, principalmente grupos políticos e econômicos. Mas seguimos, com ética e responsabilidade.”

Ao longo dos anos, o Preto no Branco se manteve crítico e independente, enfrentando dificuldades financeiras e a desconfiança de patrocinadores. “Os patrocínios não chegam com facilidade. E como mulheres, enfrentamos ainda mais resistência. Somos duas profissionais que lidam com jornada dupla, vida familiar, e mesmo assim não abrimos mão do nosso propósito.”

Um consultor do Sebrae, certa vez, usou uma metáfora que ficou: “Vocês colocaram um Fusquinha na garagem. Hoje dirigem uma BMW.” Para Sibelle, o que mudou foi o tamanho da estrutura mas não a essência. “Continuamos fazendo jornalismo de verdade. Que apura, que investiga, que transforma.”

Alcance e repercussão

O impacto do portal também se reflete em números. Somente no mês mais recente, o Preto no Branco alcançou 11 milhões de visualizações no Instagram, consolidando sua presença nas redes e ampliando o contato direto com a comunidade.

Com essa audiência crescente e engajada, o portal reafirma seu lugar como uma das principais vozes jornalísticas do interior baiano, rompendo barreiras digitais e levando denúncias, histórias e reflexões a um público cada vez mais atento.

Essa presença ativa, plural e corajosa desperta também o reconhecimento de leitores e agentes culturais da região. Para o escritor João Gilberto Guimarães:

“O portal Preto no Branco tem cumprido um papel crucial na comunicação do Vale do São Francisco, com um jornalismo instigante, corajoso e plural. Ao mesmo tempo que informa, também abre espaço para o debate e fortalece as muitas pautas sociais da nossa região.”

Nas ruas, esse sentimento se repete. Sueli dos Santos, dona de casa, vê o portal como um apoio direto para os moradores:

“Esse portal foi uma benção para nós, moradores de Juazeiro, pois sempre que procuramos para cobrar alguma demanda ao poder público ou denunciar alguma situação, somos ouvidos e temos espaço para nos expressar. As respostas também vêm rápido. É nossa defensoria, nossa ouvidoria.”

O reconhecimento também vem de outros profissionais da comunicação.

“Essa equipe é show! Sempre pronta para nos atender e buscar soluções para a cidade. Os profissionais investiram em um blog que representa os moradores de Juazeiro, principalmente aqueles que mais necessitam de voz”, considera o radialista Arielson Leal.

Esses retornos reforçam o que o portal construiu: credibilidade, afeto e confiança popular, não por estratégia de marketing, mas por serviço público.

Formação, juventude e legado

Além de ser um veículo de denúncia, o Preto no Branco tornou-se um espaço formador de novos comunicadores. Estudantes de Jornalismo atuam como estagiários, aprendendo na prática a apurar, ouvir, escrever e se posicionar. Atualmente, 3 discentes do curso de jornalismo da Uneb- Universidade do Estado da Bahia contribuem com o veículo: Rayza Rocha, Bruno Emanuel e Ally Viana.

“O PNB é mais do que o cão de guarda da democracia. O Preto no Branco ecoa a voz da comunidade. Aqui, aprendi que o jornalismo não é para autopromoção, mas para provocar mudança social. É ética, verdade, inteligência e compromisso com o interesse público”, descreve a estagiária Rayza Rocha que há cerca de oito meses compõe a equipe.

Yonara, hoje com nove anos de experiência no portal, também atua na formação: “A chegada dos estagiários me traz novos aprendizados. Além disso, tem sido gratificante passar para eles um pouco da minha vivência como profissional.”

Desde a origem, o portal investe em novos formatos. Criou a TV Preto no Branco, com coberturas audiovisuais sobre cultura, política e economia da região, e lançou o programa Preto no Branco na rádio TransRio FM, ampliando o alcance do conteúdo em áudio. O antigo programa digital “Palavra de Mulher”, suspenso na pandemia, está nos planos para ser retomado nas plataformas digitais.

Resistir é verbo feminino

O portal é uma realização coletiva, mas também é, nas palavras de Sibelle, uma prova de que o empreendedorismo feminino pode vencer barreiras estruturais:

“Se é difícil para um homem manter um veículo alternativo, imagine para duas mulheres. A gente lida com críticas, sobrecarga, incompreensão. Mas resistimos com resiliência. E nos tornamos referência.”

Hoje, o Preto no Branco é procurado por veículos nacionais quando há fatos relevantes em Juazeiro. É citado, replicado, e sobretudo ouvido por quem mais importa: a população. “A mais importante reportagem é sempre a que gera resposta. E isso acontece com a gente todos os dias.”

Yonara reforça: “Com certeza faltaria um jornalismo próximo da comunidade, que escuta a população e cobra as autoridades sem medo.”

No fim das contas, como Sibelle resume, o portal é um corpo vivo, sensível e pulsante e é o coração que segue à frente, batendo por justiça, verdade e transformação.

Ally Viana, estudante de Jornalismo Multimeios/Uneb estagiário Portal Preto No Branco

1 COMENTÁRIO

  1. Jornalismo sério, abrangente, comprometido com o que se propõe, se preciso corta na “carne”, corajoso e sem rodeios. Tenho acompanhado o crescimento do “Preto no Branco” daqui de longe da terrinha e me orgulha ver que em Juazeiro temos um canal de comunicação deste nível, que denuncia injustiças e desmandos, que cobra respostas e é a voz dos que não encontram espaço, nem força para isso, jornal atualizado, de qualidade e próximo da realidade local. Parabéns à Sibelle e sua equipe, fazem um excelente trabalho, torço que cresçam cada vez mais e nunca se calem.

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