A autorização do uso do nome social nos registros escolares da educação básica, foi uma das vitórias conquistadas pela comunidade trans no Brasil. Porém, mesmo após cinco anos da decisão do Ministério da Educação (MEC) muitos alunos Travestis e Transexuais ainda enfrentam o descumprimento deste direito nas salas de aula.
Essa situação, considerada como transfobia, vem sendo enfrentada pelo adolescente Yuji Castiel Stolze Costa, de 17 anos, segundo a mãe do jovem, Rebecca Stolze Reis. Em contato com o PNB, ela contou que a identidade de gênero do filho, que cursa o 2 ano, não está sendo respeitada pela gestão do Colégio Estadual Cecilio Mattos, em Juazeiro, Norte da Bahia.
“Desde o ano passado, quando ele realmente se identificou como um menino trans, e assumiu a sua identidade de gênero, ele solicitou junto a escola a alteração do nome, só que não mudaram. A gestão da escola até chegou a explicar que era uma troca que teria que ser feita de forma manual, mas falta realmente o interesse, porque entrou o ano e o problema continuou. No mês passado ele falou com a vice-diretora, após perceber que ela ia fazer a chamada, pois lá eles os nomes dos alunos são afixados na porta da sala e assim fazem a chamada. Na ocasião, ele chegou até ela e falou que lá ainda estava seu nome de registro, e pediu que, por gentileza, ela fizesse a alteração. Ela falou que fazer ia fazer, mas não fez. Depois ela passou a fazer uma chamada na sala e ficou chamando o nome de registro do meu filho. Chamou por umas três, quatro vezes o nome feminino que consta no registro e ele não respondeu”, contou a mãe.
Ela relatou que o adolescente foi coagido a responder pelo nome de registro e não pelo nome social.
“Nesse momento ela apontou para ele e perguntou: ‘Não é você que é (nome de registro)?’ Aí ele ficou sem ação. Ela ainda insistiu dizendo: ‘Me responda, eu estou falando com você. Eu quero que você responda’. E isso na frente de todos os colegas. Ele se sentiu constrangido”, relatou a mãe de Yuji Castiel.
Rebecca contou ainda que após o ocorrido, procurou a direção da escola para falar sobre a situação, mas foi recebida de forma hostil.
“Lá eu encontrei um clima de bastante animosidade. Quando a vice-diretora me viu, ela já questionou: ‘O que foi Yuji? O que aconteceu? Você chamou sua mãe só por causa do nome?’ eu falei: ‘A senhora sabe o nome dele?’ e ela respondeu que sim, desde o ano passado. E eu falei que não parecia, pois no momento da chamada, chamou ele pelo nome feminino. Ela tentou justificar dizendo que eu tinha que entender, que é coisa demais na cabeça dela, e eu questionei se tinham muitos alunos trans na escola para ela lidar. Disse ainda que meu filho avisou antes da chamada e pediu pela alteração do nome, e mesmo assim, ela insistentemente quis que ele respondesse como nome de registro. Ela ainda partiu pra cima de mim, dizendo que era muita ruindade da minha parte dizer que ela estava discriminando meu filho. Ela realmente se alterou, alterou o tom de voz, virou as costas e saiu”, acrescentou.
A mãe do adolescente informou ainda que neste mês de abril, o aluno voltou a ser vítima de constrangimentos e transfobia na instituição de ensino.
“O nome de registro dele continua na chamada e no início deste mês, o Yuji novamente teve que passar pelo constrangimento de ser chamado de Yasmim. Ele falou comigo de novo, e então procurei a Secretaria de Desenvolvimento Social, Mulher e Diversidade de Juazeiro, pedindo que me ajudassem com algum documento oficial em relação a isso, para que a escola realmente se posicionasse e isso acabasse. Então, o pessoal da Secretaria redigiu junto com o jurídico o documento, falando das portarias sobre o direito que o Yuji tem de usar o seu nome, no gênero que ele se vê. O Yuji entregou ao diretor o documento e o gestor saiu constrangendo, humilhando meu filho na frente da escola inteira, perguntando o que é que eu queria, se por acaso era dinheiro, e que eu não iria encontrar dinheiro lá”, declarou Rebecca.
Diante do ocorrido, Rebecca afirmou que era entrar com uma ação contra os envolvidos, em busca de justiça.
“Já tem um boletim de ocorrência, e vou fazer um outro boletim de ocorrência, porque isso é uma agressão, é um crime, que precisa ser punido. As pessoas precisam saber que existe lei, e quem desrespeita a lei deve ser punido severamente. Inclusive, eu já procurei a Secretaria novamente e foi marcada uma reunião com o jurídico para a gente judicializar o caso. Queremos também a transferência interna entre escolas da rede para Yuji. Eu não quero dinheiro, e se o processo tiver bônus, vou querer que seja revertido para as causas sociais referentes as pessoas que sofrem transfobia. Eu não quero dinheiro para mim, mas eu quero respeito. Eu quero que eles calem o preconceito deles. Eu quero que eles respeitem as pessoas e respeitem o meu filho. É só isso realmente que eu quero”, finalizou.
O PNB também conversou com a Assistente Social Emanuela Fonseca, que está acompanhando o caso do adolescente. Ela explicou que a situação será encaminhada para o Ministério Público e também para o Conselho Tutelar.
“Importante salientar que transfobia é crime, equiparado ao crime se racismo e prevê reclusão e multa para quem incorrer neste crime. Tal prática tem uma funçao marcante que é tratar o segmento transexual, travesti e transgênero como uma subcategoria de pessoas, promovendo exclusão social, negando o acesso aos serviços, escolas quando não se respeita nome social, negando o direito de existir, de pertencer e ocupar espaços.
Dados da realidade, nos mostram que por conta de episódios como este, de transfobia, essa população evade da rede escolar potencializando a sub empregabilidade e as vulnerabilidades em geral. Enviaremos relato ao MP e Conselho Tutelar no intuito de assegurar a permanência do adolescente em pauta na rede de ensino”.
Após a denúncia, procuramos a Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC). O órgão informou que “o nome social do estudante já foi incluído no Sistema de Gestão Escolar, após autorização da mãe, por tratar-se de menor de idade. Destaca que já designou a apuração do caso junto à unidade escolar” (ASCOM SEC)
Redação PNB/ Imagem ilustrativa