Uma carta para Edésio Santos: “Quanto tempo, meu velho!”, por Sibelle Fonseca

4

 

Hoje, meu amigo Edésio Santos, completaria 89 anos. Nos deixou aos quase 67. Compartilho com vocês uma carta que fiz a ele prefaciando o livro “Lento caminhar- histórias e canções”, resultado do TCC – Trabalho de Conclusão de Curso, de Edilane Ferreira e Edésio Santos, estudantes à época. Um livro que reputo como um dos mais embasados que já li sobre as estórias de Juazeiro. Lastreando em uma pesquisa séria e escrito com maestria pelos dois jovens em 2012. “Lento caminhar- histórias e canções”, jamais foi publicado, apesar de trazer o músico, referência de Juazeiro, como personagem central de tantas histórias da cidade. Um livro que precisa ser publicado. O livro!

Confira a carta para Edésio:

Ah, como eu queria que você, meu boêmio, voltasse novamente para enfeitar as nossas noites!

Quanto tempo, meu velho!

E eis que sou escolhida para preludiar a sua história, preparar os leitores para conhecê-lo sem fantasias, sem o folclore que o cerca.

Me senti presenteada em poder relembrar nossos momentos e topei, de cara, porque você merece ser contado de verdade e com a fidelidade desta amiga de sempre.

Não falarei em você com distância, nem usarei o passado. Você vive em mim e nos que tiveram a felicidade da sua amizade. Deus me livre de tratá-lo como um morto. Você não me perdoaria.

Edésio Santos. Um bocado de menino. Uma porção de gente grande. Um guri eterno que chegou a melhor idade vivendo tudo que podia viver. Sei que gostaria de ficar mais um pouquinho sim, mas você não comprometeu nenhum momento de felicidade por medo de ir embora mais cedo. Viveu intensamente. Não é um arrependido ou frustrado com a vida.

Um homem de alma nobre. Bobo quando quer se fazer, mas de uma sagacidade impressionante. Astuto e matreiro, sempre com as respostas muito bem pensadas e até atrasadas, mas sempre dadas com um toque de humor ou ironia. O paciente mais inquieto que já conheci. Era a alma de artista que não te dava paz, amigo! E graças a sua inquietude tantos acordes surgiram, tantas poesias pulsaram, tantos amores vividos, tantos passos foram dados sem rumo ou na direção certa. Vai saber!

Sinto saudade de você! Sinto falta de você nos meus dias aqui. O verde dos meus olhos ficam molhados quando permito que as lembranças venham, aos montes. Consigo ver seu caminhar lento e o seu pensamento voando longe. Consigo ver o sorriso de canto, as vezes comedido, as vezes farto. A gargalhada reservada somente para a intimidade. A conversa arrastada, sobretudo quando a cerveja ditava as letras, uma por uma. E recebíamos o dia, entre papos e canções. Eu atravessando seu violão e você se adiantado para me salvar de um escorregão feio. Você, querendo me conduzir no repertório da bossa e outras obras tão primas e eu, com a ansiedade dos mais jovens, te trazendo o novo que você tirava de letra e me impressionava. _ Você já sabia essa , Edésio? – Não, peguei agora! E assim nunca me deixava sem cantar a música que eu quisesse. Tá aí uma prova de que seu violão nunca envelheceu, portanto jamais morrerá. Sintonia. Cumplicidade, generosidade, admiração, definem bem nossa relação, que foi além da música. Vivemos vários papeis nesse palco. Ora filha e pai, ora mãe e filho, conselheiros um do outro, irmãos, amigos e eternos amantes da vida. Somos excelentes parceiros, meu velho! Um par perfeito nos sentimentos e emoções. Na música, na boemia, no jeito simples de viver, de ver o mundo. Somos “vivedores”! E todo “vivedor” é “morredor” E daí? Bem melhor que ser morto vivo, não¿

Preciso te confessar que nunca mais encontrei um violão igual. Que me deixasse segura, protegida, entregue. Que contemporizasse meus erros e vibrasse com os meus acertos.

Preciso te dizer que Juazeiro continua a mesma ingrata com seus artistas, mas agora se rende a você. Um pouco tarde demais, né amigo? Tanto poderia ter sido feito a tempo. Tem seu nome em Avenida, o Festival ainda acontece, suas músicas são cantadas por alguns que reconhecem o valor dos seus versos, mas o melhor mesmo é que a nova geração tem buscado conhecer a sua história. Assim você se torna imortal. Esse livro é fruto de uma pesquisa apurada feita por estudantes que, concluindo o curso de jornalismo, dão esse presente a Juazeiro, aos seus amigos, a sua família. Eu agradeço, em seu nome.

Por falar em família, estou, vez em quando, com os seus e nos emocionamos quando lembramos de você. Com Edinho e Almerinda, as lágrimas e a cerveja gelada brindam a sua existência.

É vida que segue, amigo!

Estou por aqui … chorando e cantando!

Um beijo! Sibelle

4 COMENTÁRIOS

    • São palavras de saudades, de admiração, de reconhecimento. Sibele Fonseca reverência aquele que talvez seja o maior artista Juazeirense sem deixar de chamar a atenção da nossa cidade embromação ao reconhecimento e respeito aos nossos artistas. Parabéns Sibele Fonseca pelo texto.

  1. O que dizer de Edesio Santos, músico boêmio, deixou legado, fez artista famoso e ai tudo certo, eu ainda guri me lembro daquela varanda que soava seus acordedes nas tardes da Floriano. Um abraço eterno.

DEIXE UMA RESPOSTA

Comentar
Seu nome