“Juazeiro e sua complexa relação com as chuvas”: Confira desabafo do leitor Odilon Neto, morador do Residencial Juazeiro 3, Itaberaba, em Juazeiro

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O leito Odilon Neto, morador do Residencial Juazeiro 3, no bairro Itaberaba, em Juazeiro, enviou à nossa redação seu desabafo de cidadão juazeirense sobre a “complexa relação da cidade com as chuvas”.

A voz de Odilon representa as vozes de milhares de munícipes que moram em bairros sem a mínima infraestrutura e sofrem “ano após ano”, nos períodos chuvosos.

“Vale salientar que a entrada do residencial, interditada pela impossibilidade de acesso devido à água da chuva, é o único caminho disponível para centenas de trabalhadores que precisam sair de casa diariamente,” destacou o cidadão.

A interdição ocorreu na manhã de hoje, após rompimento de barragem, que provocou o transbordamento do canal que corta o bairro.

Confira

Juazeiro, cidade central da microrregião do Sertão do São Francisco, na Bahia, é privilegiada por sua localização às margens do Velho Chico. No entanto, mesmo com essa proximidade de uma das maiores fontes hídricas do país, a cidade, situada no semiárido brasileiro, enfrenta contradições marcantes durante o chamado “verão chuvoso” da região.

Para as comunidades rurais que dependem do cultivo de sequeiro, as chuvas que começam a cair por volta de novembro são sinônimo de esperança. Elas trazem a possibilidade de uma colheita farta, garantindo renda e sustento para muitas famílias. Porém, para os moradores das periferias urbanas de Juazeiro, a chegada da chuva desperta receio, ansiedade e a dolorosa lembrança do descaso do poder público.

Eu, assim como os demais moradores do Residencial Juazeiro 3, no bairro Itaberaba, e tantos outros cidadãos das áreas periféricas da cidade, sofremos ano após ano com a precariedade da infraestrutura urbana e do saneamento básico. Problemas que já são constantes tornam-se ainda mais evidentes quando as chuvas chegam. As ruas alagam, serviços essenciais entram em colapso, esgotos transbordam e a ameaça de doenças se espalha.

Vale salientar que a entrada do residencial, interditada pela impossibilidade de acesso devido à água da chuva, é o único caminho disponível para centenas de trabalhadores que precisam sair de casa diariamente. O que resta a essas pessoas? Será que deveríamos investir em embarcações para navegar nesse córrego improvisado que se forma a cada temporal? Ou quem sabe, sonhar com ônibus híbridos que trafeguem tanto no asfalto quanto na água? Seria cômico se não fosse trágico, já que as poucas unidades de transporte que circulam pelo bairro já se encontram em situação precária.

Essa não é uma realidade nova, e os políticos — tanto em nível municipal quanto estadual — estão plenamente cientes dos transtornos que as chuvas causam. Mesmo assim, seguimos sem soluções concretas.

O descaso me remete ao filme Parasita, vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2020, que retrata de maneira crua como as diferenças de classe (e, por que não, também as diferenças geográficas, no caso de Juazeiro) resultam em experiências completamente opostas diante de um mesmo fenômeno natural. Enquanto alguns celebram a chuva como bênção, outros a temem como mais um gatilho para o caos e a exclusão.

A população, sempre cobrada pelo cumprimento de seus deveres, tem seus direitos negados constantemente. Saneamento básico e planejamento urbano continuam sendo negligenciados nas áreas mais pobres e afastadas do centro — um padrão repetido por todas as gestões que já passaram pela cidade. Até quando Juazeiro será tratado como o “bairro sujo” da cidade vizinha?

Por fim, faço um apelo ao prefeito, vereadores e demais representantes do poder público, especialmente aqueles que saíram desta terra: olhem com mais compromisso para essa questão. A falta de políticas públicas que garantam dignidade e segurança para a população mais vulnerável é uma forma de violência diária. Precisamos de soluções reais para que possamos sair de casa sem medo, ir ao trabalho sem dificuldades e viver com a dignidade que nos é devida.

Odilon Neto

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