Sempre Aos Domingos: “Divinas e majestosas, com medos, azias, agonias, culpas, desconfortos”, por Sibelle Fonseca

1

 

Fazem das mães um ser sobrenatural, sobre-humano, super-humano. De carne, osso e alma, como qualquer mortal, mãe de 4 filhos, não sou nada disso. Nem temo em dizer que este é o mais difícil dos papeis que alguém pode assumir na vida. Ainda que os filhos sejam umas bençãos, como são os meus.

Passamos 9 meses em um turbilhão de sensações e transformações. Os hormônios chegam a ser perversos e, a cada segundo, vão fazendo de marionetes as mães em formação. O corpo muda dormindo e acorda diferente. A cabeça não sossega um só minuto. Alias, começa aí, pra durar uma vida inteira, o desassossego das mães. Nos primeiros meses, enjoos, medos, azias, agonias, culpas, desconfortos. Do meio pra o fim, inchaços, dores nas costas, nas pernas, peitos que pesam, medos, agonias, culpas, desconfortos. A fêmea forte e frágil nem se reconhece. Chega a hora e é pra valer. Receios, medos, agonias, culpas, desconfortos: E se eu não conseguir? Chama por Nossa Senhora do Parto, grita pela mãe e entrega-se à natureza por completo. Ela age, de um jeito ou de outro, ela age.

Se der cria, viramos criadoras de novas criaturas que passaremos a conhecer a partir daquele momento. O leite desce, as vezes flui, noutras empedra, mamilos doem e as horas não são mais nossas. O peito jorra 24 horas e a qualquer momento precisa alimentar. O dia passa a ter 48 horas, a madrugada pode ser insone e emendar com o sol se pondo. Acabou qualquer possibilidade de rotina.

Divinas e majestosas, como diz a poesia, seguimos uma vida de medos, azias, agonias, culpas, desconfortos. O sinônimo de mãe deveria ser preocupação, penso eu. Pra vida inteira. Se no berço, ela acorda pra ver se respira sua cria; Se engatinha, vibra, mas já temendo os próximos passos; começam as primeiras passadas, e o coração de mãe fica aos pulos: Vai cair, vai se machucar, acode Jesus! Os pequenos, a passos desgovernados, gargalham com a conquista e nem imaginam que tem um olho ali aflito, vigiando, pra segurar na menor queda. O medo persegue as mães, o medo é o fantasma das mães. O medo das mães protege os filhos. Deve nascer daí o ditado de que é bom seguir conselho de mãe. Elas se antecipam, anteveem e por isso estão sempre aflitas. É, ser mãe é estar em estado constante de aflição. A verdade é essa. Mãe nunca termina o expediente, jamais descansa e nunca bate o ponto.

Eles crescem, alçam seus voos, fazem suas escolhas, engrossam o pescoço e a voz, apanham do destino, sofrem suas dores, rompem amores, ganham dinheiro, direitos, deveres, mas o ninho de mãe não se desmonta nunca. Seguramente, ela não hesitará em pedir para si qualquer sofrimento que o filho passe e, sofre junto, nem poder espernear, porque antes de tudo ela precisa ser forte. Seguramente, haverá uma cama, um colo, uma comidinha na casa de mãe.

Sim, ser mãe é doloroso, e, levando em conta a minha experiência, é muito prazeroso  também. Ver alguma coisa sua na face, no gene, no jeito e nos trejeitos de alguém, é como se eternizar. Lembrando que, também se eternizam aquelas que deixam livros, árvores, ideias, pensamentos e outros afetos. Todas mães.

Pari 4 filhos de parto natural e os amamentei até a última gota. São 3 meninas e um menino que, quando apresento a alguém, digo logo: “São os meus … essa é a minha … é o meu aqui”.

Sim, minhas meninas e meu menino dão todo o sentido a minha vida. São meus antecedentes criminais, cartão de visita e também meu seguro de vida.

De cedo, os criei mostrando minhas imperfeições e fragilidades. Naturalmente, fui uma mãe gente que sentiu raiva, teve vontade de esganar, ficou de mal por uma malcriação, disse muitos nãos, broncas e proibições. Também permiti, me omiti, faltei, transbordei, dei desculpas, leves castigos, pequenas mentiras, lições e princípios. Dei conselhos, alguns que nem eu seguia, dei bons e maus exemplos, mas nunca soltei nem o dedo mindinho de nenhum dos quatro.

Nunca bati em um filho e me arrependo de uns safanões que dei em Mariana num carnaval aí.

Eu sempre fiz o que pude, com o que tinha. Fui mãe aos 16, quando nem sabia ainda o que era ser mulher. Decorrido meu tempo de mãe, sou hoje uma mulher prenhe de mim mesma e deles todos que saíram do meu útero. Filhos não deixam o útero da mãe, jamais, mesmo cortado o cordão umbilical, essa aliança transcende.

Confesso que permaneço sendo uma mãe com medos, agonias, culpas e desconfortos.

Mas meus filhos sabem que mães não são sobrenaturais e isso basta. Foi assim que a maternidade para mim, não foi prisão. Vivi do meu jeito. Vivemos, eles e eu, do nosso jeito, e assim nos igualamos cada dia mais. Em princípios e idiossincrasias.

Sendo essa mulher, que poucos conhecem de verdade, declaro que acertei errando e errei querendo acertar. Deu certo, ao final. Mas olha, forte mesmo eu sou quando tenho os quatro dormindo em casa, sob o meu mesmo teto. É como uma compensação das madrugadas que passei em claro embalando cólicas ou feliz com os olhinhos que se despertavam querendo brincar. Era chato, mas era mágico.

Tentei escrever um poema sobre mães, mas comecei errado. Não sou boa em versos curtos. É que sou um oceano de pensamentos e palavras e, ser mãe, é uma ambiguidade.

É desafiador e mágico!

Ser mãe de Carla, Pingo, Mariana e Ananda é, antes de tudo,

Sibelle Fonseca é radialista, militante do jornalismo, pedagoga, feminista, humanista, mãe de Carla, Pingo, Mariana,  Ananda e humana de Diana, cantora nas horas mais prazerosas, defensora dos direitos humanos e dos animais, uma amante da vida e das gentes.

1 COMENTÁRIO

DEIXE UMA RESPOSTA

Comentar
Seu nome