Uma vez, lá no começo dos anos 1990, eu fui ver um show de Ivete Sangalo no Bar Tio Chico, em Petrolina. A expectativa era grande. Não éramos amigos, mas eu a conhecia e a todos os irmãos, do Country- o clube , onde quase todos os domingos se encontravam as crianças de classe média da cidade e onde os Sangalo se destacavam por serem destemidos e pularem do trampolim mais alto.
Enfim, eu estava ansioso para ver Ivetinha (como lembro dos amigos dela a chamando), porque tínhamos amigas em comum, que já me contavam do seu talento. Além disso, seu pai era seresteiro, sua irmã já cantava e a família era conhecida pelos saraus na casa do Country- o bairro.
Vizinhos do meu padrinho de crisma, meu tão amado e saudoso Tio Bispo, tenho uma memória bem remota de um destes saraus em que meu pai, também seresteiro, estava.
Fomos então ao show: eu, meu irmão e minha cunhada da época ( meu irmão já vai no terceiro casamento…). Tenho bem nítida a sua imagem momentos antes de entrar no pequeno palco do bar. Ainda pensei em cumprimentar, mas estava tão concentrada, que, obviamente, preferi apenas passar.
Foi a última vez que a vi antes da fama. E foi a primeira vez que ela me impressionou. Tanto que, metido que eu era , fiz uma crônica sobre o show e na segunda-feira estava publicada na seção de cultura do Jornal de Juazeiro (atual Diário da Região). O título era “Ivete Sangalo: uma explosão de canto !”
No texto cheio de adjetivos eu exaltava toda a beleza da sua voz, o repertório, a sua emoção ao cantar a música preferida do pai que havia morrido há pouquíssimo tempo. Fiz uma associação com cantoras que eu amava e amo. E o que me deixa mais orgulhoso: fiz uma previsão de que, em muito pouco tempo, o Brasil inteiro iria se render ao deslumbre que era Ivete. Também fiquei feliz porque soube por tia Adelaide, que ela leu a crônica e queria saber quem era o autor ( eu assinava com meu nome completo ).
Cerca de um ou dois anos após, já a vi em Maceió, numa micareta, em cima de um trio, linda, arrastando uma multidão e acenando toda feliz pra Walter Guerra Filho – e pra mim por tabela. Eu não contive o choro e lembrei da minha crônica, do meu amor por Juazeiro, por arte e especialmente por música.
O resto é história que o Brasil e o mundo já sabem. É talento , é carisma, é estrada, é luta, é verdade, é brasilidade , é juazeiranidade, como diria Fatelzinho.
Tem coisa que não se explica e a gente apenas olha pra ela e diz “é o jeito de ser juazeirense, é o nosso jeito …”
Pena que não sou de guardar as coisas e há muito tempo perdi o jornal com a crônica. Qualquer dia desses, vou lá tentar fazer este resgate.
O mais importante é que estamos aqui, os vivos e os encantados, celebrando a vida de uma filha querida da terra, a filha de Sangalo que vendia joias pra minha mãe e de Dona Ivete que usava uns lindos vestidos longos. Daquele show no Tio Chico, nunca vou esquecer de Ivete Sangalo cantando “Serra da Boa Esperança” e de que o bar estava tão cheio, que o atendimento foi ruim, péssimo mesmo.
O garçom demorou tanto a nos entregar a conta, que demos um belo de um calote e saímos sem pagar. Até hoje tenho pesadelos, achando que o coitado do garçom vem atrás de mim.
Feliz aniversário, Ivete! Muita saúde e um rio de alegrias para você. Contigo nosso carinho e nosso orgulho. Sorte grande, a nossa, em agradecer juntos por sua vida.
Eu, você, João e todo mundo que te ama por este país afora. Ah, a Minha mainha te manda um beijo!
Rogério Leal, juazeirense, médico, cantor



