Luis Henrique da Silva Pereira, Luisão Pereira, nasceu em Juazeiro da Bahia, no dia 29 de julho de 1968. Irmão de Antônio Carlos Tatau, cantor e compositor, e sobrinho de um dos baluartes do samba baiano, Ederaldo Gentil, Luisão se criou na música, vive da música e para a música. Firmou seu nome na história da Música Popular Brasileira e segue se alimentando dela, se curando com ela, produzindo e transcendendo através de suas suas criações.
Músico, compositor e produtor brasileiro, navegou em vários instrumentos e, inicialmente, escolheu o rock como forma de expressão. Fundou a Cravo Negro e ganhou a cena baiana. Ao lado da banda Penélope, conquistou indicações a dois prêmios Multishow de Música Brasileira e quatro indicações ao VMB, o prêmio da MTV. Com a Penélope fez centenas de shows pelo país.
Daí pra cá, gravou, arranjou, tocou os mais diversos instrumentos, conquistou vários prêmios, se apresentou em grandes palcos e produziu discos e shows de artistas comoLos Hermanos, Nação Zumbi, Mombojó, Elza Soares, Titãs, Paralamas do Sucesso, Tom Zé, Banda do Mar, Marcelo Camelo, Bruno Capinan, Canto dos Malditos, Leoni, entre tantos outros.
Desde 2017, vem vencendo um câncer de mieloma múltiplo com muita dignidade e coragem. Preferindo “fazer música ou piada!”.
O PNB teve o privilégio de conversar com ele, que lança “Fogo no Mar”, nesta sexta-feira (2).
PNB: 1 Vamos revisitar sua trajetória na música? Como se deu o início desta relação?
Luisão: Aí em juazeiro,. Aos 6 anos de idade fui aluno de piano da Prof. Judith Palma, depois ganhei um cavaquinho do meu tio Ederaldo. Porém, só depois, aos 9 anos de idade, quando vi uma apresentação do Grupo Exodus, que tinha uma turma maravilhosa: Tatau, Mauriçola, Coelhão, Zé Maurício, Expedito, Euvaldo Macedo, Sérgio Dinamite, Zeinha, Julião, Carlinhos… foi que quis aprender violão e guitarra para um tempo depois, aos 11 anos, formar a minha primeira (e acredito que primeira da região também) banda de rock de Juazeiro, a Conjuntivite. Estreamos num show surreal, na ilha do Fogo, com duas das principais bandas da cena punk de Salvador dos anos 80:“Trem Fantasma” e a “Delirium Tremens”. Na época, por um acaso, o Jornalista da “Revista Roll”, que era a principal revista brasileira de música naquela época, estava de passagem pela cidade, assistiu e resolveu escrever sobre numa matéria que falava da nova cena de rock da Bahia. Foi inacreditável!
PNB: Tatau, seu irmão, os amigos músicos dele que frequentavam sua casa. Fala sobre essas influências?
Luisão: Foi o alicerce. Tatau com a turma dele, tanto a de Juazeiro quanto a de Salvador e Ederaldo Gentil, meu tio, que levou Batatinha, Nelson Rufino, Chocolate da Bahia e tantos outros ícones para dentro da minha casa e eu comecei a ter contato com pessoas que tinham a música como ofício.
PNB: Foi o rock sua senha de entrada? E, a partir daí … Hoje tem algum gênero que te define?
Luisão: Sempre gosto de falar que faço apenas música, me incomoda o rótulo. Aquela fase de se identificar apenas com um gênero, no meu caso o rock, durou até aos 17 anos de idade, quando eu era muito ingênuo, e não sabia que, desde a Conjuntivite, que formei com 13 anos, já existiam em mim influências diversas. Tinha uma das nossas músicas que no meio dela tocávamos uma parte instrumental do baião “Juazeiro” de Luiz Gonzaga. Também era de nosso repertório a “Paulinho D.A”, que era de autoria de Luiz Galvão e Mauriçola. Ou seja, nunca fomos só rock, impossível ser naquele meio que eu vivia.
PNB: Nascido e criado em Juazeiro da Bahia. Mais exatamente na Praça da Bandeira, filho do Dr Humberto do Semec, vizinho da família de João Gilberto. Fala das tuas lembranças. Juazeiro por você? Juazeiro para você?
Luisão: Nossa, são tantas, afinal morei lá dos 0 aos 17 anos de idade e sempre voltava pra passar as férias. Estudei na Escola de Vivinha (irmã de João Gilberto), uma vez peguei um copo de água pra ele na sala da minha casa. Lembro do padre reclamando do barulho que o ensaio da minha banda fazia no horário da missa. Lembro dos meus amigos da rua, da praça da igreja, dos loucos que circulavam por lá: João Doido, Amassa Barro, Maria Pezinho, Iara (que informava a programação do cinema) e um outro que imitava uma moto – esqueci o nome dele – mas que uma vez até peguei uma “carona”. Sem falar na pracinha, que, além de jogar bola, brincávamos e, mesmo crianças, costumávamos ficar até de altas horas da madrugada. Mas o grande divisor de águas pra mim, foi o movimento cultural “Chá das 5”, foi lá que subi num palco pela primeira vez, muito contra a minha vontade, pois eu era tímido demais, mas me fez entender qual era o meu caminho. Tinha também o cine clube que me abastecia bastante … A Juazeiro da minha infância e adolescência transpirava arte, era incrível!
PNB: Tem a exata noção da tua influência em tantos outros que encaram a música como propósito? E dessa potência que você é?
Luisão: Tenho noção que fui um lunático que saiu de juazeiro numa época em que o mundo era muito mais distante. E, como a maior parte do tempo atuei em bastidores, ou discretamente em palcos, a minha exposição nunca foi tão grande. Porém de vez em quando, até mesmo aí da terra, vem uma ou outra pessoa falar que minha trajetória foi inspiradora para elas. Agradeço e sempre tento de alguma maneira apontar possíveis caminhos. Do pessoal recente, tem vários artistas que conheci e gostei bastante. na minha última ida a juazeiro inclusive, marquei encontro com geral. Gosto muito de Fatel e a Trupe, Conheci Andreza Santos (aquela sua música com ela é linda!), Nanda Rocha, Fernanda Luz, Josyara também é daí, Joyce Guirra. Tem muita coisa boa acontecendo na terra.
PNB: Como quem faz de um limão, uma limonada, você produziu um dos álbuns mais importantes da sua caminhada, lançado recentemente, em meio ao tratamento de um câncer. Do meu Coração Nu, de Zé Manoel. Foi uma espécie de musicoterapia associada às dolorosas intervenções médicas?
Luisão: O álbum de Zé me ajudou bastante, pois começamos ele e logo em seguida comecei uma parte pesada do tratamento, então, estar com a cabeça completamente envolvida me fez ter forças. A música realmente é curativa. Além de produzir, eu gravei violão, guitarra, baixo e teclados nele, tudo em meio a pandemia e a cirurgias. Tentava me concentrar só nisso. Atrasou bastante o processo, mas valeu a pena. O disco foi pro Grammy, a música para a novela Pantanal e Zé deu mais um passo importante na carreira.
PNB: Receber um diagnóstico de câncer com tanta vida pela frente, como tantos projetos e sonhos, para alguns, significa uma sentença de morte, paralisação de tudo. Você foi na contramão e não se entregou. Produziu, deu movimento a vida, seguiu e vem seguindo. Assim vem driblando esse desafio?
Luisão: Um dia falei em terapia que estava agoniado porque podia morrer em dois ou três anos, daí a minha terapeuta me lembrou que tinha um monte de gente que ia morrer naquele dia mesmo e nem sabia. Imediatamente lembrei de uma canção do meu disco, feita antes da doença, mas que fala: “Deixa, ninguém sabe da vida … Deixa, há sempre uma surpresa, um ponto de partida, depois de um outro adeus.” Ou seja, vamos, só vamos!
PNB: Sabia que é inspirador e tranquilizador observar como você lida com o tratamento? Poetisa as sessões quimioterápicas, sem romantizar. Tira onda com a dor, respeitando-a. É muita dignidade para enfrentar uma doença tão cheia de estigmas. Diz pra gente, como se consegue isso.
Luisão: Foi a única maneira que encontrei para suportar. Nada foi pensado, apenas sigo como dá, em muitos momentos gritei de dor ou chorei de medo, mas prefiro fazer música ou piada!
PNB: O menino Luisão está chegando a casa dos 60. Envelhecer te assusta ou está sendo um privilégio?
Luisão: Calma Sibele, ainda tô chegando aos 54! rs. Mas envelhecer, mais que nunca, tá sendo um prêmio. E sim, quero chegar aos 60!
PNB: Sonhos, futuro, vida. O que mais virá de você?
Luisão: No momento divulgando o disco “Fogo no Mar” que está saindo e, quando der, voltar a trabalhar mais presencialmente, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, que é onde morei por dez anos, atuei bastante no mercado e consequentemente faço mais coisas por lá. Também quero, muito, tomar um banho no velho Chico. Esses são os planos, por enquanto.
Honrados com este bate papo, relembramos que “Fogo no Mar”, está sendo lançado nesta sexta-feira (2) e recomendamos a você que pesquise Luisão Pereira, ouça esse menino juazeirense. Ele é inspiração no que pensa, sabe, faz e vive! Um beijo, Luisão!