DIREITA OU ESQUERDA? Faz diferença? Por Ivânia Freitas

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Um dia desses (antes do golpe) alguém (da ‘direita’) me dizia: “não há mais direita e esquerda no Brasil”. Gastei uns bons dias pensando sobre isso a partir da questão: o que faz um ‘cara’ de direita fazer essa afirmação?

Há uma lógica nessa afirmativa muito interessante para dialogarmos, tendo em vista que estamos em tempos políticos acirrados, onde se demarca efetivamente, um desenho cada dia mais claro da existência desses dois polos – direita e esquerda.

O argumento de que essa ‘divisão’ ou categorização estava superada tomava como base: a) o conjunto de medidas políticas e práticas individuais e coletivas dos partidos e governos de esquerda, que em nada se diferenciavam daquelas tomadas e assumidas pelos partidos de direita. Por exemplo, as práticas de concessão às empresas privadas da gestão de rodovias, como foi feito em parte da Bahia; b) os altos investimentos do governo federal no agronegócio; o superlucro dos bancos privados; c) as políticas educacionais coladas aos princípios do mercado.
Evidentemente há práticas de direita na esquerda. Mas, o que isso quer dizer? O que a priori parece ser uma constatação ruim (e é!) talvez nos lance boas perspectivas interpretativas que cabem bem nesse momento.

Boff nos alertava em um dado momento que há uma crise na esquerda. Eu diria que há uma crise nos partidos de esquerda e não na esquerda.

A esquerda como ‘lugar’ de representação dos oprimidos em busca de emancipação; a esquerda como lugar da luta pela superação do modo de vida abusadamente marcado pelas amplas desigualdades sociais; a esquerda como lócus do pensamento elevado para uma sociedade justa, essa, penso eu, não mudou. Os partidos ou parte de seus membros (ou em sua totalidade) podem ter mudado. Se rendido ou sido vencidos pelos princípios da direita. Afinal, como disse Freire, a semente do opressor também reside no oprimido Ôps! Mas, o que é a direita?

A direita é o outro lado. É o lado dos opressores. Dos que se mantiveram ‘fortes’ pela exploração, pela opressão. Sua base orientadora e que desenha a atuação dos partidos que a conformam é: fortalecer o mercado e manter assim, a divisão de classe; fortalecer o poder político com acordões que desconsideram princípios democráticos e constitucionais, mas que favorecem a política conservadora (a ordem e o progresso); afirmar-se do lado (e apenas dele) do grande empresariado com medidas que enfraquecem o Estado Brasileiro (como as privatizações e não apenas, as concessões) e a precarização das relações de trabalho (fragilizando as políticas trabalhistas, os processos educativos/formativos e as politicas de incentivo ao crédito, etc).

Para a direita, o cidadão é apenas força de trabalho; a criança, futura força de trabalho; os idosos-são peso para a previdência; os movimentos sociais nada mais são do que ‘um bando de gente baderneira’ que merece ser tratado aos chutes e pontapés pelos militares.

A direita é isso e mais um pouco. Mas, havemos de convir, os partidos que a compõem, são muito mais ‘coerentes em seu projeto’ do que os de esquerda têm sido (com o projeto da esquerda).
Com o advento do governo temporário golpista de Temer, as medidas dizem exatamente a quem a direita quer agradar/favorecer. A grande mídia que tem lado (e é o da direita) fala em rombo nas contas públicas para justificar a redução dos investimentos na saúde, educação, em políticas de moradia, etc; e fortalecer a presença do setor privado, minando o patrimônio do Estado Brasileiro.
Contraditoriamente, a base do ‘governo’ aprova um ajuste de 42% nos salários dos juízes e de outras carreiras federais com impacto de bilhões na economia (em crise?).

Para alguns, ser de direita ou de esquerda, especialmente para os que se aproximam da política pela mídia e não pela labuta diária, é uma questão de opção. Eu diria que talvez não. Talvez seja muito mais uma questão de visão de si; de enxergar-se no todo social e perceber-se enquanto sujeito numa relação individual e coletiva onde se encontra e com quem se encontra, a serviço de qual tipo de mundo, de que modelo de sociedade.

O processo de votação do golpeachment revelou o quanto o pensamento de direita avançou no Brasil. Como o lugar do opressor ganhou espaço e sufocou os princípios originais de partidos tradicionais de esquerda ou parte deles, reconfigurando o cenário político drasticamente.

Posições altamente conservadoras ganharam espaço em partidos que historicamente a combateram e a nossa tão jovem democracia ficou exposta. Há uma ofensiva contra as camadas menos favorecidas da população e as vemos serem tocadas com aval de partidos de esquerda que nasceram forjados no combate a estas forças.

O pensamento de direita também alcança parte da população (‘classe média’) para a qual a pobreza é “uma disfunção social, um fenômeno natural, ou até mesmo uma categoria estatística” que não interessa. Influencia parte da própria parcela menos favorecida que, alienada, não percebe quem trabalha contra seus próprios interesses. A direita permanece na sua caminhada e se utiliza de todos os mecanismos que dispõe para se fortalecer e ampliar suas redes.

O que será que há? A esquerda acabou?

Não, a esquerda não acabou. A esquerda permanece viva em partidos que andaram na contradição e precisam se rever sob a pena de perderem sua história, mas, cujas matrizes permanecem à esquerda; em partidos que se mantém firmes, íntegros e corajosos no enfrentamento das forças hegemônicas e conservadoras e se afirmam à esquerda; em partidos que tentam não se perder (mesmo que permanecem fazendo alianças perigosas em nomes das urnas), mas que se mantém (na contradição) à esquerda.

Os princípios da esquerda permanecem vivos, sobretudo, nos movimentos sociais (representativos da classe trabalhadora) que incansavelmente saem em marchas seja no campo ou na cidade; nos sindicatos, associações, nas universidades, nos grupos de jovens, bem como entre os estudantes resistentes e esperançosos que sinalizam inconformidade com a realidade concreta que os absorve.
A direita também permanece viva. Ela está presente nos partidos que sempre a representaram; entranhada nos partidos que um dia estiveram à esquerda e que já não mais se alocam em seus princípios; presentes naqueles que se denominam de ‘centro’ e que são os mais esdrúxulos (pois são oportunistas, cobras disfarçadas à espreita), observando qual lado mais favorece aos seus interesses imediatos e sempre vergonhosos.

Direita e esquerda estão mais que vivas do que nunca e suas distinções são cada dia mais evidentes (para quem tem boa capacidade de enxergar). Os seus princípios também estão reavivados e eles se revelam diuturnamente e de muitas formas.

Nesse ‘limbo’ que vivemos, nesse curto tempo em que o governo golpista assumiu, as distinções ficaram fortemente escancaradas e, ao povo, é dada a oportunidade de comparar e conferir.
Quando o ‘cara de direita’ afirmava que não há mais a distinção direita/esquerda, sob o argumento de que as práticas da direita estavam na esquerda, inconscientemente ele nos dava uma importante dica: A ESQUERDA É DIFERENTE e é por isso que nesse momento precisamos retomar o diálogo sobre os elementos que as distinguem em dois polos tão extremos.

Dos partidos da direita a gente já sabe o que esperar, é o que foi, o que é e o que sempre será. Só avança pra pior.Dos partidos de esquerda a gente espera coerência e coragem para dizer não aos princípios, práticas e projetos que os tornam iguais aos partidos de direita.

Coragem pra fazer uma limpeza ética e romper com a parte podre que estraga todo o cesto.Coragem para construir um novo formato de estruturação de suas propostas e práticas e avançar na ‘busca de relações radicalmente democráticas, de uma política efetivamente popular’ o que exige desagradar às oligarquias politicas e os grandes grupos econômicos que agora, sob o lastro do golpe, se fortalecem e ganham fôlego para enterrar os importantes avanços conquistados em favor da classe trabalhadora que, nestes últimos 13 anos, mesmo com as grandes contradições expostas, a esquerda brasileira conseguiu construir.

Penso que o momento vivido agora dá ao Brasil a possibilidade de sentir (na pele) que DIREITA E ESQUERDA são direções completamente opostas.

Qual direção tomar?
Eu sei a minha e você?

Professora Ivânia Freitas – UNEB- Campus VII – Doutoranda em Educação pela Universidade Federal da Bahia.

1 COMENTÁRIO

  1. Eu professora, continuo na direção de sempre, sigo pela esquerda. Sei que muito prrecisa se rever como sabiamente citou, mas para o publico da minha classe que é de agricultores/as familiares nunca se se fazer tanto como nos governos de Lula e Dilma.

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