A importância das referências na construção da identidade étnico-racial

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Todo mundo precisa de referências para tudo, ou quase tudo. As referências são como pistas de um caminho…. Ou muitas vezes o próprio caminho. Servem para ir a um lugar que desconhecemos, servem no currículo para indicar nossa procedência e o que queremos, servem na construção da nossa identidade étnico-racial.

Quando somos crianças aprendemos por imitação. O bebê não é um ser alheio ao que ocorre a sua volta. Na verdade, está “ali”, com olhos e ouvidos atentos, “filmando” tudo. Registra palavras e atitudes, e vai compondo seu próprio banco de dados, que será seu portfólio de experimentos. O tempo vai passando e ficamos mais exigentes, nossas referências podem ganhar ar de sofisticação, mas em tese não fogem muito do que temos ao alcance, porque é a repetição de uma ocorrência que a torna uma referência. E na formação do “eu”, da personalidade e da identidade cultural, as referências são fundantes.

Buscamos referências em modelos simbólicos elaborados. Os heróis, os mártires, os ídolos…. Reconhecemo-nos neles, queremos ser como eles…. Quando não nos percebemos representados, tendemos a negar a nós mesmos, tal a força da necessidade das referências. Então, ligamos a TV e os heróis são todos brancos. Jesus é branco. Na escola, aprendemos que aqueles que defenderam uma causa, que lutaram pelo país, são todos brancos. Está nos livros, quem há de duvidar? Os negros são os empregados, os escravizados, os desvalidos….
Não há deuses nem heróis negros na cultura ocidental. E nos livros, apenas as memórias da escravidão. O fato é que seres humanos são complexos, e é difícil assumir uma identidade étnico-racial quando não nos enxergamos nas referências que estão ao nosso alcance.

Ninguém se pergunta como os europeus colonizadores foram capazes de tratar seres humanos como propriedade e de forma tão cruel. Ninguém se pergunta como convenceram a sociedade de que tal prática era legítima. Ninguém se pergunta o que foi feito com os negros após a abolição da escravidão. Ninguém se pergunta que diabos aparece em todos os censos desse país que sua população é majoritariamente negra e por que os negros não estão na mídia nem nos espaços de poder? Ninguém se pergunta por que quando aparece pobreza e criminalidade, o foco é sempre posto no negro. Por que se associa a criminalidade aos negros? Alguém viu um negro na lava a jato? Por que estranhamos quando vemos um negro rico, médico? Não é no mínimo estranho que 45,5% dos negros cheguem a universidade, contra 71,4% de brancos?

Os negros precisam de referências negras nos espaços de poder para que se identifiquem como negros, para que assumam a sua identidade étnico-racial e sejam militantes das causas que afetam a sua dignidade, enquanto coletivo. Mas a necessidade dessas referências não é exclusiva dos negros… brancos também precisam ter referências negras para que se desmistifique o mito da superioridade racial dos brancos, para que a convivência comum entre diferentes/iguais torne o racismo um traço de um passado longínquo e inaceitável para todas as gentes de todas as raças!

Professora Adriana Pinheiro Santos (IFBA – Campus Juazeiro); Socióloga e Mestre em Educação; Membro dos Movimentos Antirracistas do Vale.

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