Em carta, grupo de professores da UPE denunciam descaso do governo

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Um grupo de docentes da Universidade de Pernambuco (UPE) escreveu uma carta onde denuncia o descaso que sofrem do governo. No texto, eles dizem que desde o primeiro semestre a reitoria não tem implementado as dedicações exclusivas solicitadas e aprovadas em todas as instâncias relatadas anteriormente, utilizando-se como justificativa os impedimentos previstos na lei de responsabilidade fiscal e nas recomendações realizadas pela Secretaria de Administração do Estado de Pernambuco, através do ofício 504 de 01 de agosto de 2016.

Os professores não se identificaram por medo de repressão. Veja a carta na íntegra:

O descaso do governo com os (novos) professores da Universidade de Pernambuco

“A formação de um professor universitário é marcada por um longo caminho, que tem início na graduação e se estende até o doutoramento, com um período que pode chegar a mais de 12 anos de trabalho. Após este momento, a grande expectativa dos recém-doutores é o ingresso em uma universidade, com o objetivo de desenvolver os seus projetos e colocar em práticas as ações que por anos foram orientados a desenvolver.

O concurso para a docência no ensino superior exige uma árdua e demorada preparação, constituída em sua maioria de prova escrita, prova didática, apresentação do plano de trabalho a ser desenvolvido na instituição e uma análise curricular. Em busca de uma afirmação profissional, os egressos dos cursos de pós-graduação se lançam a certames em várias localidades do país, com a disputa entre os seus pares igualmente preparados. Para poucos, a aprovação vem na primeira tentativa, outros precisam se “aventurar” nos mais diversos concursos, reversando-se entre os editais, os livros, os projetos, as aulas e as pesquisas, o trabalho na universidade pública se apresenta como uma realidade para se colocar em prática a autonomia científica e a inserção nos principais centros de excelências do ensino superior do país.

O caminho para o ingresso como docente na Universidade de Pernambuco – UPE não é diferente. Nos últimos anos, os concursos organizados pela instituição têm apresentado significativa concorrência, seja devido ao aumento no número de doutores que são lançados ao mercado de trabalho todos os anos, ou pelo interesse dos docentes aos projetos desenvolvidos na instituição.

É inegável que a aprovação e consequente nomeação para a vaga de professor efetivo da Universidade de Pernambuco é uma das maiores alegrias para um doutor que busca um “lugar ao sol”. Após a nomeação, os projetos que sempre foram planejados, as aulas dedicadamente elaboradas, novas propostas de ensino, orientações de iniciação científica, formação dos grupos de pesquisa e o encontro com os estudantes são algumas das expectativas vivenciadas pelo novo docente.

Neste novo cenário vivenciado pelo professor, a Universidade de Pernambuco tem um ponto particular entre as suas questões burocráticas. Após a nomeação, os ingressos que pretendem trabalhar com dedicação exclusiva na instituição precisam apresentar um projeto de pesquisa, que deve ser desenvolvido em quatro anos (com a possibilidade de renovação), para que o seu pedido possa ser avaliado pelo pleno departamental do curso em que está lotado, pela direção da unidade de ensino, a comissão local e a comissão central da reitoria.

Todo o processo descrito se fundamenta na disponibilidade exclusiva que o docente se oferece aos trabalhos na universidade, contabilizando 40 horas de atividades semanais, divididas entre o ensino, a pesquisa, a extensão e a administração. Pela legislação vigente, a instituição deve garantir que até 50% dos seus docentes trabalhem como dedicação exclusiva. No entanto, atualmente, o número de professores que solicitaram esta condição está entre 35 % do efetivo da UPE.

Além de um acréscimo de 50% de gratificação a partir do salário base, a dedicação exclusiva oferece melhores condições de trabalho para o professor. A aprovação do seu projeto lhe garante condições de se dedicar apenas a uma instituição, assim como, a possibilidade de desenvolver as suas atividades com excelência. Como reflexo desta afirmativa, pode-se identificar professores mais dedicados, alunos com orientações direcionadas, projetos desenvolvidos nas unidades de ensino, captação de recursos, organização de eventos, dentre outras ações de extrema importância para o universo acadêmico.

No entanto, mesmo com estes benefícios apresentados, seja para os docentes ou para a instituição, atualmente esta não é uma realidade aplicada aos professores da Universidade de Pernambuco em 2016. Desde o primeiro semestre, a reitoria não tem implementado as dedicações exclusivas solicitadas e aprovadas em todas as instâncias relatadas anteriormente, utilizando-se como justificativa os impedimentos previstos na lei de responsabilidade fiscal e nas recomendações realizadas pela Secretaria de Administração do Estado de Pernambuco, através do ofício 504 de 01 de agosto de 2016.

Das solicitações realizadas a partir de março de 2016, em todas as unidades de ensino da UPE, nenhum projeto foi implementado pela reitoria. O mais grave nesta questão se configura na falta de informação entre os docentes, sobretudo, os recém-nomeados que ao questionar a reitoria não recebem informações precisas e que possam contribuir para a sua programação acadêmica e financeira.

A Associação dos Docentes da Universidade de Pernambuco (ADUPE), órgão de classe que representa a categoria, em nada tem contribuído com as reivindicações destes professores. As suas ações estão muito mais voltadas para questões extras que aos problemas mais diretos dos novos docentes, que não recebem informações sobre a condução dos diálogos com a reitoria e os órgãos que representam o governo do Estado.

Sobre a questão financeira, é importante destacar que muitos dos professores que foram nomeados em 2016 são oriundos de cidades fora de Pernambuco ou precisaram se deslocar para as unidades do interior, com altos gastos necessários para a mudança ao novo lugar. A falta de diálogo, de atendimento a uma expectativa que foi divulgada em edital, tem gerado grandes problemas para os professores e as suas famílias.

Certos da implementação do sistema de dedicação exclusiva em suas atividades, vários docentes se afastaram previamente de outras instituições, exigência prevista nas normas da universidade, o que acarretou uma grande redução nos seus rendimentos. Percebe-se que os professores se prepararam para assumir uma modalidade de função, cumpriram com todos os requisitos, adotaram todas as especificidades necessárias, mas não têm o respaldo da Universidade de Pernambuco para atender o que já está aprovado e o que foi previsto em edital.

Vários são os docentes que se deslocaram para Petrolina, por exemplo, para se construir uma nova vida a partir das garantias financeiras apresentadas na divulgação do concurso. Tais garantias deram lugar a angústias e a expectativas que estão reverberando em questões de saúde de cada funcionário, como a depressão e a ansiedade.

Têm-se notícias que alguns professores, que se deslocaram para as unidades de ensino mais distantes da capital, estão passando por dificuldades financeiras para garantir a compra de material de trabalho, deslocamento para a universidade, pagamento de aluguel e até mesmo com os gastos de primeira necessidade, como alimentação e vestuário. Tal questão atinge diretamente a autoestima do docente, que após passar por um desgastante processo de seleção agora se sente desprestigiado por uma instituição que em seu discurso preza pela qualidade de suas atividades.

Outro ponto importante a se destacar é o assédio moral que alguns professores mais antigos e chefes imediatos na UPE têm realizado para que os novos docentes, mesmo sem a gratificação da dedicação exclusiva, continuem com o trabalho de orientação, pesquisa e divulgação científica. Muitos já escutaram nos corredores a típica frase: “cuidado com o estágio probatório”. Este texto está sendo divulgado sem autoria, devido ao receio de repressão dos superiores imediatos.

Reconhecemos o momento singular que a economia do Brasil vivencia. Compreendemos as determinações da lei de responsabilidade fiscal, mas sentimos que a dosagem para a questão financeira não se aplica com isonomia a todas as camadas do funcionalismo público em Pernambuco. Um exemplo foi o aumento que parte dos funcionários do Tribunal de Contas do Estado receberam em agosto de 2016, informação amplamente divulgada pela imprensa pernambucana no dia 08 de setembro e que teve o apoio da Assembleia Legislativa de Pernambuco. Também poderíamos destacar a progressão e consequente aumento de quase R$: 10 mil reais nos proventos do governador Paulo Câmara, enquanto funcionário de carreira do TCE, divulgado na portaria nº 391/2016 e nos principais veículos de comunicação.

Vale salientar que as solicitações de implementação de dedicação exclusiva paradas na reitoria gerariam um impacto financeiro mínimo ao Estado e a UPE. A redução dos gastos, ou o impedimento da abertura de novos débitos, devem ser repensados nas prioridades da universidade. Desde o início desta questão, a reitoria não apresentou proposta de redução de gastos em outras áreas para atender a uma questão tão urgente dos seus professores.

Será que a falta de um diálogo entre a ADUPE, como representante destes professores que hoje passam por dificuldades, e a reitoria atende a interesses de algum lado? Será que a falta de informação é uma prática dos gestores da Universidade de Pernambuco com os seus docentes? Até quando vamos precisar receber notícias de que os novos professores, ainda sem receber o salário integral apresentado em edital, estão se afundando em dívidas? Será preciso estes profissionais, que imaginaram que estariam em uma instituição preocupada com a qualidade de vida dos seus funcionários, lançar-se a um novo concurso e abandonar os projetos pensados e já iniciados para UPE? É certo que tal prática não contribui com a permanência de docentes, com currículos comprovadamente destacados em suas áreas, em uma instituição que não dialoga em um instante tão delicado.

Tenho certeza que o pior incomodo não é apenas a questão financeira, mas principalmente a falta de uma resposta ou uma expectativa de resolução do que foi exposto neste texto. Os docentes estão desamparados pela ADUPE, não são respondidos de modo direto pela reitoria, e assim, todos os dias em uma sala de aula da Universidade de Pernambuco um professor perde seu estímulo, não tem recursos para comprar material para a sua próxima aula, pensa na dificuldade familiar, sente a pressão dos seus superiores e reflete sobre a falta de respeito da instituição com o seu trabalho. Até quando vamos esperar? Até quando não teremos respostas da reitoria? Até quando não seremos representados? Até quando a Associação dos Docentes da UPE vai fingir que nada acontece? Até quando continuará o descaso com os docentes? Mais uma vez ficaremos sem respostas? “.

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