Para salvar a concessão do Galeão, o governo bateu o martelo ontem e decidiu que a Infraero vai fazer um aporte parcial de R$ 120 milhões no consórcio. Ficou acertado ainda que os sócios privados vão acompanhar a estatal e colocar a mesma quantia, somando R$ 240 milhões — valor que vai ajudar a pagar uma parte da outorga de quase R$ 1 bilhão, que venceu em maio. A injeção de recursos será feita em aportes mensais da Infraero e do sócio privado. Cada um contribuirá com parcelas de R$ 10 milhões. O prazo final para o pagamento total, incluindo multas e juros, termina no próximo dia 31, mas as autoridades estão dispostas a dar algum fôlego para a concessionária. A ideia é aceitar desembolsos parciais, inclusive ao longo de 2017, até que o Congresso aprove a medida provisória (MP) 752, que muda o processo de concessões.
Além disso, o Executivo vai apoiar uma emenda à MP que permitirá o escalonamento de outorgas. O texto original não prevê esse parcelamento, apenas abre a possibilidade de relicitação amigável, delegando questões como a reprogramação de outorgas para serem solucionadas por uma comissão de arbitragem.
Hoje, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), poder concedente, fará uma reunião com os sócios da RIOgaleão e os bancos credores para informar as ações em andamento e tranquilizar o mercado.
— A ideia é mostrar que está sendo costurada uma solução e que não haverá uma alternativa drástica — disse um interlocutor do governo.
A decisão de permitir o escalonamento das outorgas foi tomada após consulta informal ao Tribunal de Contas da União (TCU), segundo fontes que acompanham a negociação. O montante a ser pago pelas concessionárias referente à outorga deste ano deve ser decidido pela Anac nesta semana.
Pelas regras do contrato, o não pagamento da outorga impõe à Anac a execução das garantias. As concessionárias (Galeão, Confins, Brasília, Natal e Viracopos) devem à União R$ 1,437 bilhão em outorgas vencidas entre janeiro e julho deste ano. O pagamento pode ser feito em atraso, desde que no mesmo ano.
A renegociação da outorga é um ponto crucial para a manutenção da concessão do Galeão. Apesar da pressão da concessionária, o Executivo não incluiu essa possibilidade na MP, diante da resistência do TCU.
Também pesou na decisão do governo o efeito negativo que uma medida como essa poderia trazer para o mercado. Ela poderia abrir brechas para lances “irresponsáveis” nas concessões. Segundo uma fonte diretamente envolvidas nas discussões, com o respaldo do Legislativo, ao sacramentar a emenda, o governo fica mais confortável em atender ao pleito do setor.
‘SEGURANÇA JURÍDICA PARA O INVESTIDOR’
O relator da MP, deputado Ségio de Souza (PMDB-PR), disse que o texto passará por ajustes. Ele contou que recebeu mais de 80 emendas e vai analisá-las no início de fevereiro. Informou que pretende fazer audiências públicas, ouvir concessionárias e governo para apresentar o relatório, o que deve ocorrer em março.
— Precisamos trazer segurança jurídica para permitir que o investidor possa planejar a médio e longo prazos — disse o deputado.
Ele mencionou que os interesses dos usuários também devem ser levados em conta na busca de soluções para os problemas das concessões antigas, conforme propõe a MP. O texto também permite a renovação antecipada de contratos em troca de novos investimentos em rodovias e ferrovias.
A queda nas receitas do Galeão devido à recessão econômica e o envolvimento da Odebrecht na Lava-Jato ajudam a explicar as dificuldades financeiras da concessionária, a RIOgaleão. O consórcio é formada por Odebrecht Transport (com 60%) e pelo operador do aeroporto de Cingapura, Changi Airports International (com fatia de 40%). O controle do aeroporto é dividido entre a concessionária privada, que detém 51% do capital, e a Infraero, estatal que tem participação de 49%.
O aeroporto foi leiloado há pouco mais de três anos, por R$ 19 bilhões — o que representou ágio de 294% sobre o lance mínimo de R$ 4,8 bilhões. A nova concessionária assumiu a administração e operação do terminal em agosto de 2014 por um prazo de 25 anos. Até o fim desse período, a previsão é que sejam investidos no terminal R$ 5,2 bilhões.
No entanto, a concessionária alega que as receitas do aeroporto são insuficientes para pagar a outorga. Para honrar o compromisso assumido com a União durante o leilão, a RIOgaleão informa que precisa do empréstimo de longo prazo do BNDES, que foi suspenso por causa da Odebrecht.
GALEÃO E VIRACOPOS EM SITUAÇÃO MAIS CRÍTICA
Para contornar o problema, o sócio estrangeiro cogita aumentar a sua participação no consórcio, comprando a parte da empreiteira e, ainda, trazendo um novo investidor para tocar o negócio. Essas soluções, porém, dependem da negociação da outorga, alega a concessionária. Ao todo, a dívida da RIOgaleão chega a R$ 3 bilhões, considerando a outorga vencida em maio e a que a vai vencer, além do empréstimo-ponte concedido pelo BNDES na primeira fase da concessão.
De acordo com dados da Anac, os casos do Galeão e de Viracopos são os mais críticos. Eles entraram na agência com pedidos de reprogramação no cronograma de pagamento à União. Brasília, Confins e Natal estão recolhendo os valores em juízo. Guarulhos quitou a dívida principal de R$ 1,1 bilhão, que venceu em julho, mas falta pagar os juros.
Procurada, a assessoria de imprensa da concessionária RIOgaleão informou apenas que está negociando com o governo federal uma solução definitiva para o problema. O texto justifica o desempenho abaixo do esperado do aeroporto.
A concessionária afirma que “segue em entendimentos com o governo federal a fim de encontrar uma solução definitiva para a sustentabilidade da concessão, que prevê a reprogramação dos pagamentos anuais da outorga sem perdas para o governo. A ação se faz necessária devido à imprevisível queda expressiva do PIB (Produto Interno Bruto) por dois anos seguidos, coincidindo com os anos de maior necessidade de caixa para investimento e somado à não liberação de empréstimo de longo prazo, o que afetou o fluxo de caixa previsto”, diz uma nota divulgada pela concessionária.
O Globo