Casos de feminicídio em Juazeiro assustam e preocupam representantes da rede de proteção à mulher

0
Três das vítimas de femicídio em Juazeiro-BA no ano de 2017

“O feminicídio é a instância última de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex-parceiro.

Feminicídio é o assassinato de uma mulher pela condição de ser mulher. Suas motivações mais usuais são o ódio, o desprezo ou o sentimento de perda do controle e da propriedade sobre as mulheres, comuns em sociedades marcadas pela associação de papéis discriminatórios ao feminino, como é o caso brasileiro.

Feminicídio é crime, desde a entrada em vigor da Lei nº 13.104/2015, que alterou o art. 121 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940), para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio.

A Bahia está em segundo do rancking dos lugares que mais praticam violência contra mulheres no Brasil, segundo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Segundo a pesquisa realizada em 2013, 17.000 mulheres morreram por conflitos de gênero, o chamado feminicídio. A Bahia representa 9,08% dos crimes, atrás do estado do Espirito Santo com 11,24% – que lidera o ranking – o nordeste brasileiro concentra a maioria das mortes de mulheres.

Dados comprovam que a maior parte dos homicídios acontece entre as mulheres negras. Pior, eles somaram um aumento de 54% em 10 anos, apontou o Mapa da Violência 2015. Sendo que 50,3% das mortes violentas de mulheres são cometidas por familiares e 33,2% por parceiros ou ex-parceiros.

Estes dados são assustadores, mas bastante reais. E também traduzem a realidade da violência contra à mulher, em Juazeiro(BA). Os números constam no Mapa da Violência Doméstica na Cidade, uma pesquisa inédita na região, realizada pela 9ª Promotoria de Justiça de Juazeiro e feita através de um levantamento parcial de casos, visando colher informações concretas sobre a situação atual e demandar ideias para enfrentamento do problema.

Segundo o mapa, o mês de outubro, nos anos analisados, apresentava alto e destacado índice de violência doméstica. O centro da cidade, seguido do bairro Itaberaba, configuram com os de maior incidência em casos de violência contra a mulher. O levantamento também sugere que sejam realizadas ações de enfrentamento a este grave problema que afeta toda a sociedade. A pesquisa aponta também que em menos de 50% dos casos analisados o agressor foi notificado das medidas protetivas deferidas.
Segundo a Deam de Juazeiro, nestes dez anos foram mais de 14 mil ocorrências registradas, o que dá uma média de 120 registros por mês. Também foram mais de 3 mil pedidos de medidas protetivas. Ao longo desta década, o município de Juazeiro registrou onze (11) feminicídios, um número abaixo da média nacional.
Mas a escalada de feminicídio no município tem assustado os representantes da rede de proteção à mulher e enfrentamento da violência.
Nestes seis primeiros meses de 2017 foram registrados cinco assassinatos de mulheres. O último aconteceu na noite de terça-feira(20) no bairro Itaberaba e vitimou a jovem Laise dos Santos Silva de 20 anos.

Ela foi atingida com disparos de arma de fogo e o principal suspeito é o seu ex companheiro, que segundo informações, não estaria conformado com o fim do relacionamento. Ele está foragido.No dia 03 de maio deste ano, a jovem prestou uma queixa na Delegacia da Mulher, contra o ex companheiro, que tinha efetuado vários disparos de arma de fogo contra ela.

Daquela vez, Laise não foi atingida. Recebeu uma medida protetiva, o agressor foi notificado de que deveria permanecer 500 metros de distância dela, mas, de acordo com a polícia, teria descumprido a medida para realizar seu intento.

Antes desta vítima de feminicídio em Juazeiro, outras quatro mulheres foram mortas por companheiros ou ex-companheiros.
A maioria delas já tinha prestado queixa na Deam contra seus agressores. Buscaram proteção, mas não escaparam das garras do machismo que mata na certeza da impunidade.
Dra Roseane Mota, delegada da mulher, diz que a denúncia é importante, mas as vítimas devem levar a situação de violência a sério e colaborar com o trabalho da polícia ” Muitas mulheres e suas famílias acabam subestimando as ameaças e agressões. Prestam queixa, no momento do conflito, depois acabam abandonado o registro e dificultando ou até impedindo nosso trabalho.”
O Portal Preto No Branco ouviu alguns representantes da rede sobre o aumento dos casos de violência contra a mulher, em Juazeiro e também sobre o último feminicídio que vitimou a jovem Lais.
Maria José Alves, presidenta do CMDCA – Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher assim se expressou  “Lamentavelmente uma brutalidade por um machismo obstinado, que desafia a justiça nas medidas protetivas, a polícia Militar, a Civil e a fragilização das nossas leis diante da sede de matar de. uma pessoa que para afirmar que é macho e que manda. Temos que mudar nossas defesas. Na primeira violência, prender de imediato para assegurar a vida da mulher. Não dá mais para ver nossas guerreiras tombarem de forma brutal. Mudar o código de processo penal, alterar a Lei Maria da Penha para continuar no enfrentamento desse machismo e da violência agressiva contra todas as mulheres”, ressaltou.
O Juiz Haroldo Carlos, da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, lamentou a morte da jovem e falou da sua preocupação com os números assustadores da violência contra a mulher ” Esta notícia terrível, deixa a todos muito sentidos, principalmente a nós que trabalhamos diretamente com a temática de gênero, e que tentamos minorar com nosso trabalho os assustadores números ligados à violência contra a mulher. Ainda parece muito cedo para fazermos uma avaliação segura quanto às razões para o aumento específico dos casos de feminicídio. De qualquer sorte, chama a nossa atenção o fato deste último crime ter ocorrido no bairro Itaberaba, que vem sempre aparecendo como aquele com o maior número de casos de violência contra a mulher em nossa cidade. Outro dado que também chama a atenção é que o suposto agressor seria ex-companheiro da vítima, situação também muito usual nos delitos de gênero. O que aconteceu com a jovem, mais uma vez evidencia aquilo que todos nós já sabemos: o machismo mata. Recebo sempre com enorme perplexidade notícias de casos de feminicídio em nossa cidade. Mais uma vez devemos juntar os órgãos de proteção para pensarmos juntos a presente questão. A situação é séria e precisamos buscar respostas próximas da realidade, evitando o mero achismo”, declarou o magistrado.

O Promotor Sammuel de Oliveira Luna, Titular 9a PJ de Juazeiro – Violência Doméstica, também se manifestou e demonstrou sua preocupação com o aumento dos índices  “Não obstante proteção conferida as mulheres em 2006 com a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha e a mais recente introdução da qualificadora do feminicídio aos crimes de homicídio, inciso VI do parágrafo 2° e parágrafo 2°-A do artigo 121 do Código Penal, os índices de violência doméstica contra mulher, em especial aqueles que resultam morte, tem aumentado sistematicamente no Brasil. A busca das razões ensejadoras desta triste realidade, bem como da solução para resolução do problema, é tema de debates e estudos variados. Pode-se afirmar, com certeza, que as causas para esta crescente violência são variados e complexas, passando por aspectos sociais, culturais, familiares, estruturais, etc” 

O promotor fez uma análise da situação ” Podemos dividir, dentro de toda a complexidade que este tema suscita, dois grupos de mulheres vítimas de violência doméstica. O primeiro grupo inclui aquelas que sendo vítima de violência doméstica resolvem dar um basta na agressão sofrida. O segundo grupo são aquelas que por questões diversas, a exemplo de acreditar na mudança do agressor, por ser dependente financeiramente do agressor ou por buscar manter a unidade familiar e pelos filhos, acabam por se submeter a novas e sucessivas agressões. Com relação ao primeiro grupo, os equipamentos públicos existentes na proteção à mulher, a exemplo de juízos e delegacias especializadas no combate a violência doméstica, centros de proteção à mulher, rondas de proteção a mulher (realizado pela polícia militar às mulheres com medidas protetivas deferidas), etc, vê-se que os mesmos ainda funcionam de forma precária e sem intercomunicação e atuação coordenada, sendo necessário aprimorar e instrumentalizar melhor a atuação e estrutura de todos a fim de evitar/sanar as falhas e furos existentes na rede de proteção. Já em relação ao segundo grupo, cabe ao poder público uma maior divulgação e conscientização da problemática, tanto em relação ao agressor, mas, principalmente em relação as vítimas, para que estas possam estar munidas de informações e amparo público efetivo que as dê segurança de enfrentar a violência sofrida, denunciando o agressor e buscando apoio público efetivo para que os casos que sequer chegam ao conhecimento das autoridade, e que são muitos, passem a ser conhecidos e enfrentados”

Da Redação Por Sibelle Fonseca

DEIXE UMA RESPOSTA

Comentar
Seu nome