“O que se ensina sobre escravidão nas escolas de Juazeiro?”, por Camila Alves Correa

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O que se ensina sobre escravidão nas escolas? História da escravidão e da conquista da liberdade em Juazeiro-BA

Provavelmente todos que frequentaram a escola em algum momento estudaram um pouco sobre a escravidão. Quando mencionada a “escravidão no Brasil” uma imagem forma-se na mente. É possível que a cena visualizada remeta a uma imagem cristalizada que se resume a dor, sofrimento, resignação e asujeitamento. Ou quem sabe, uma cena de rebeldia, onde o cativo, para romper com seu martírio, foge para um local inacessível, construindo um quilombo.

A localização de antigos documentos históricos nos possibilitou a realização de novas pesquisas referentes à História da escravidão no Brasil, permitindo que nos afastássemos de imagens polarizadas, nas quais ou o escravo é totalmente submisso, ou é rebelde, cristalizado na máxima “ou Zumbi, ou Pai João”. As abordagens atuais vêm se orientando pela perspectiva de que os sujeitos escravizados foram capazes de interagir no processo histórico de maneiras diversas, construindo diariamente margens de autonomia. Suas ações dependiam, também, das circunstancias de violências e oportunidades vividas cotidianamente, estabelecendo-se relações de conflitos e negociações.

No ano de 2012 foram localizados um amplo conjunto de documentos que evidenciam as práticas de escravização durante o período imperial em Juazeiro-BA. O primeiro conjunto de documentos localizados foram registros de batismos de crianças filhas de mulheres escravas durante o período de 1871-1877. A documentação encontra-se na Igreja Matriz Nossa Senhora das Grotas. Com estes assentos podemos verificar a aplicação da Lei 2.040-1871, popularmente conhecida como Lei do Ventre Livre. Essa legislação embora orientasse para a libertação das crianças nascidas de ventre cativo, deixou brechas para a continuidade da escravidão das crianças. Percebemos ao longo do período de leitura e analise, ainda na graduação sob a orientação da Profa. Ms. Tatiana Lima, que os escravos buscaram criar vínculos com os indivíduos livres, ora adquirindo matrimonio, ora criando laços de compadrio.

Posteriormente, em nova pesquisa localizamos no Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB), um novo conjunto de documentos, ações de arbitramentos, processos-crime e um testamento de um escravo liberto, todos correspondentes a década de 1880, últimos anos da escravidão. Foi possível evidenciar que os escravos recorreram à Justiça para reivindicar o fim do cativeiro, numa luta cotidiana que culminou numa conquista e não num presente, tal qual posto pela historiografia tradicional, que exalta a Assinatura da Lei Áurea.

Diante dessas histórias, demos início a uma nova pesquisa, investigar o que vem se ensinando sobre a história da escravidão no ensino fundamental das Escolas de Juazeiro. O resultado foi a dissertação em Educação, defendida dia 1º de fevereiro de 2018, no Programa de Pós-graduação em Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares da Universidade de Pernambuco, intitulada “Ensino de história: modos de pensar e ensinar a escravidão em turmas de 7º e 8º anos nas escolas municipais de Juazeiro-BA”, sob orientação da professora Drª Janaína Guimarães e co-orientação do Profº Dr. Mario Ribeiro. Além do texto dissertativo, a partir dos resultados da pesquisa e das histórias encontradas na documentação, elaboramos um livro infanto-juvenil que conta um pouco das maneiras pelas quais os cativos de Juazeiro conseguiram conquistar suas liberdades. Esse material poderá auxiliar as professoras e professores de História a trabalhar a temática com seus alunos e alunas. Contribuindo assim para modificar a visão polarizada e estática que ainda perdura em muitas escolas sobre a Escravidão no Brasil.

Capa do livro (foto: divulgação)

Camila Alves Correa é Mestra em educação pelo Programa de Pós-Graduação em Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares (PPGFPPI) UPE Campus Petrolina. Especialista em História do Brasil: Cultura e Poder. Licenciada em História pela Universidade de Pernambuco – UPE, Campus Petrolina.

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