Aos 40 anos, PT fala em necessidade de renovação, mas ainda insiste em Lula

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Quando a deputada federal Natália Bonavides, 31, nasceu, o PT já tinha oito anos. No dia em que ela completou cinco meses de idade, o partido teve seu primeiro grande êxito eleitoral, conquistando prefeituras de capitais como São Paulo (SP), Porto Alegre (RS) e Vitória (ES).

A potiguar é a mais jovem entre os 53 deputados petistas. Além dela, há apenas mais dois parlamentares nascidos depois da criação do partido, em 10 de fevereiro de 1980.
Em comparação, o PSL, que fez uma bancada equivalente à do PT, tem 18 parlamentares nessa faixa etária.

Ao completar 40 anos na segunda-feira (10), o PT busca se reerguer de seu período mais difícil, em que se sucederam Lava Jato, recessão, impeachment de uma presidente e a prisão de seu maior líder.

Para isso, uma das tarefas mais urgentes, segundo lideranças do partido ouvidas pela reportagem, é reconectar-se com setores que foram perdidos para a direita, seja liberal ou conservadora. Entre eles, a juventude.

“O principal desafio do PT é fazer a reconexão com parcelas da classe trabalhadora e da juventude que migraram para outro projeto político em 2018”, afirma Bonavides.

A deputada seguiu um roteiro que sempre foi comum para jovens do partido. Filha de petistas, subiu no palanque de Lula durante comício em seu estado na campanha presidencial de 2002. “Tenho uma foto do lado dele bem novinha, usando aparelho. Eu tinha 14 anos”, lembra.

Depois, foi líder estudantil, trabalhou com movimentos populares, elegeu-se vereadora e finalmente chegou a Brasília, na eleição de 2018.

Este percurso está se tornando mais raro. Segundo a Secretaria de Organização do PT, o partido tem 137 mil filiados até os 30 anos, o que representa apenas 8% do total dos que informaram sua idade nos registros da legenda. Os maiores de 60 anos, em comparação, são 24% deste universo.

“A questão da renovação é dramática para nós. O PT é um partido que envelheceu”, afirma Gilberto Carvalho, 69, ex-chefe de gabinete de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência e um dos quadros históricos do partido.

“À esquerda, o PSOL, conseguiu uma certa renovação. À direita, isso aconteceu graças a investimentos feitos pelo [empresário Jorge Paulo] Lemann que resultaram em lideranças como a [deputada] Tabata Amaral, além de grupos como o MBL [Movimento Brasil Livre]”, diz Carvalho.

Recuperar esse terreno, segundo ele, passa por encontrar um novo discurso para transformações estruturais que ocorreram na sociedade desde que o PT foi afastado da Presidência, há quatro anos.

Ele cita o crescimento das relações de trabalho informais, ocorrida após a reforma trabalhista, e a chamada “uberização”. “Não podemos reproduzir cânones antigos. O mundo mudou, a sociedade mudou”, afirma.

O que permanece imutável no partido é a deferência a Lula, e a defesa permanente de sua candidatura presidencial. Após um longo período de cerco político, em razão da Lava Jato e dos escândalos que atingiram a figura de seu maior líder, o partido parece ter readquirido alguma autoconfiança.

A Vaza Jato, a libertação do ex-presidente e os erros políticos do governo de Jair Bolsonaro têm estimulado petistas a gritar “Lula 2022”, apesar de todos os processos judiciais que ele enfrenta. “Temos de estimular outras lideranças, mas nenhuma se igualou a ele. Não temos outra figura sedutora da mesma forma que Lula. Defendo que seja ele [o candidato], com certeza”, diz Carvalho.

Na onda vermelha de 1988, o ex-bancário Olivio Dutra deu ao partido uma de suas maiores vitórias, ao conquistar a Prefeitura de Porto Alegre. Depois, foi governador do Rio Grande do Sul e ministro de Lula, de quem se mantém muito próximo.

Fundador do partido, ele defende um autoexame intenso do PT para reconhecer erros. Escândalos como Lava Jato e mensalão seriam resultado de uma certa permissividade em práticas da legenda.

“Nesses 40 anos, o PT ficou muito parecido com outros partidos, ao fazer da atividade política uma coisa pragmática, ao promover um toma lá da cá, um é dando que se recebe, uma frouxura nas alianças”, diz Dutra, 78.

Segundo ele, o partido tem que se reavaliar permanentemente. “É preciso se instigar, reconhecer que o que fez não foi pouco, mas que também se equivocou e errou em outras pontas”, afirma.

Dutra, a exemplo de outras figuras emblemáticas do partido, segue defendendo Lula, mas demonstra um certo incômodo com a personificação do PT na figura de seu maior expoente. “O partido não é o Lula. Se não fosse o partido, o Lula não existiria. O partido não pode depender apenas de uma figura individual, por mais que o respeitemos”, afirma.

Desde que foi solto, em novembro do ano passado, o ex-presidente retomou a atividade partidária com gosto. Tem participado inclusive de reuniões para as quais nunca teve muita paciência, com encontros de diretórios estaduais.

Em São Paulo, entrou diretamente na articulação, até agora malsucedida, de encontrar um candidato de consenso para disputar a prefeitura. Em sua sala na sede do Instituto Lula, no bairro paulistano do Ipiranga, dá expediente quase diário, recebendo lideranças de vários partidos.

Reservadamente, petistas sabem que a possibilidade de Lula ter condições jurídicas de disputar a Presidência novamente é mínima. O ex-presidente já foi condenado em dois processos e é réu em mais seis.

Caso esteja impossibilitado de concorrer, o nome do ex-prefeito Fernando Haddad desponta novamente como favorito. Outra alternativa citada é o governador da Bahia, Rui Costa. Apoio a um nome de outro partido, como sempre, é algo praticamente descartado.

Presidente nacional do partido, reeleita em novembro para mais um mandato de quatro anos, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), 54, diz que a Lava Jato é uma ameaça constante contra o PT.

“A Lava Jato continua como uma espada na cabeça do PT, porque ele é usada como instrumento político. Sempre se saca um inquérito, uma investigação. Esse tipo de perseguição é muito forte”, afirma.

Ela detecta, contudo, um certo arrefecimento na avaliação negativa que as pessoas têm do partido, motivada pelo questionamento aos métodos usados pelo atual ministro Sergio Moro (Justiça) quando era juiz federal em Curitiba.

“A visão sobre a Lava Jato e o PT é muito diferente hoje do que tivemos em 2016 [ano do impeachment de Dilma Rousseff]. A Vaza Jato nos ajudou”, afirma ela, em referência à divulgação de diálogos entre Moro e procuradores.

Para Gleisi, houve uma carga “descomunal” em cima do PT. “Nenhum partido mereceu o processo de desconstrução que o PT sofreu. Qual a conta do Lula no exterior? Do PSDB, tem”, declara.

Esse novo ambiente, acredita ela, dá condições para que o partido retome parte da força política que perdeu para o bolsonarismo. “Essa perda é momentânea”, diz Gleisi, para quem a sociedade brasileira está sempre em disputa.

À acusação de que o PT se afastou de sua base histórica, Gleisi diz que foi parte de um processo inevitável, em que dirigentes foram chamados a contribuir com o governo.
“Houve uma transferência de quadros, para fazer frente ao desafio de governar. De fato isso deixou o partido muito fragilizado”, afirma.

O próximo passo no caminho do PT para tentar se recompor é a eleição municipal de outubro. Como o resultado de 2016 foi desastroso, é quase impossível o partido não crescer.

O possível fortalecimento de Bolsonaro, embalado pela relativa melhora da economia, não assusta, afirma a presidente petista. “Mesmo que o PIB cresça 2,5%, a vida do povo não vai melhorar. Aumentou a pobreza, a fome voltou. Basta andar nas portas dos supermercados”, declara.

Folhapress

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