Uma família que reside no bairro Vila Eulália, em Petrolina-PE, viveu na última segunda-feira (06), uma noite de sofrimento e medo. Eles acusam policiais do 2º Batalhão Integrado Especializado (BIEsp) de agressões e ameaças.
De acordo com o comerciante Willian Gomes, que trabalha junto com a esposa, Rosimere Cordeiro, vendendo acarajé no bairro José e Maria, tudo começou quando ele voltava do serviço. Ele disse que estava em um carro na companhia do amigo José Erick e não percebeu a ordem dos policiais para parar o veículo.
“Quando chegou em frente à minha casa, desci com meu colega Erik, para guardar as coisas, e eles desceram junto, dizendo: ‘Mão na cabeça, vagabundo’. Dando autoridade, gritando com a gente. Aí eu falei: ‘ vagabundo, não. Nós estamos chegando do trabalho agora, não tem nenhum vagabundo, nós estávamos chegando do trabalho”, contou o comerciante.
Ele relatou ainda que ao entrarem em casa foi seguido pelos policiais, que iniciaram as agressões físicas. Ele disse que foi imobilizado, sofreu ameaça de morte e foi espancado até perder a consciência. “Levei as coronhadas aqui na sala porque eles tinham me imobilizado. Um me deu uma gravata e os outros seguraram minhas mãos. O outro policial que estava com a 12 ficou ameaçando me dar um tiro na minha própria casa. Como eu estava imobilizado, o policial que estava com a 12 começou a dar cabada (sic) de 12 na minha cara, deu quatro vezes até eu desmaiar”.
As cenas de horror foram assistidas por Rosimeire que estava com um filho de apenas um ano no colo. Ela disse que estava com uma arma apontada para ela e que também foi agredida com chutes.
A filha de 5 anos e o filho de 12 do casal, também presenciaram às agressões, enquanto o pai de Rosimeire, de 70 anos, pedia que os policiais parassem. Enquanto isso, um PM gritava: “Atirem! Atirem pra matar”, de acordo com a família.
William contou ainda que oito viaturas foram deslocadas e 32 policiais estariam no local. Ao ser levado para a delegacia, ainda inconsciente, ele teria sido levado antes para um local deserto onde recomeçaram as agressões.
“Depois disso, eles me arrastaram. Eu não sei se estava algemado, não lembro depois que desmaiei. Só me lembro que acordei dentro do camburão. Fui desviado para outro lugar que não sei que lugar foi. Lá, fui agredido de novo. Fui chutado, espancado. Bateram muito em mim. Eles me botaram para fora e começaram a me chutar, me pisar”, acrescentou.
Rosimeire e o colega Eric, que teria ficado algemado em frente a residência, também foram levados Delegacia da Polícia Civil, do Ouro Preto, em outras viaturas.
A família disse ainda que juntou o dinheiro das despesas da casa para conseguir pagar um advogado e após fazer exame de corpo de delito, William foi liberado na manhã da terça-feira.
O caso já foi denunciado na Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Vereadores de Petrolina/PE que encaminhou a denúncia para a Central de Inquéritos do Ministério Público do Estado de Pernambuco e tem recebido apoio de entidades que atuam no campo dos Diretos Humanos e do Movimento Negro.
Em nota de repúdio, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Vereadores de Petrolina/PE declarou que “é extremamente grave a quantidade excessiva de policiais na rua violando assim as orientações do Ministério da Saúde e colocando em risco o idoso para a Covid-19”
Veja a nota na íntegra:
“A comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara Municipal de Vereadores de Petrolina-PE vem expressar seu repúdio aos atos de violência policial relatados pelo casal de comerciantes do bairro Vila Eulália.
A denúncia foi feita no último dia 07 de abril, e relata que quando o casal estava voltando para a residência da família, noite da última segunda-feira, 06, após fechar o ponto comercial no bairro José e Maria, onde vendem acarajé, o marido, juntamente com um amigo, que trabalha fazendo entregas, foram abordados por uma viatura do 2º BIESP para que parassem o veículo, porém, devido a proximidade com a residência, pararam o veículo em frente a mesma. Segundo a mulher, sem perceber o sinal que os policiais haviam dado, o companheiro dela desceu do carro e entrou normalmente em casa para acomodar os materiais que levava. Os policiais chegaram logo em seguida com atos de extrema truculência contra o auxiliar que se encontrava no carro e em seguida contra o comerciante. As agressões continuaram dentro da casa da família, diante de 2 crianças e um idoso, mesmo após pedidos para que os policiais não entrassem, devido ao risco de contaminação, tendo em vista as orientações de saúde para o combate a COVID-19.
Ainda segundo o relato, durante a ação 8 viaturas da companhia estavam presentes no local, os policiais presentes fizeram uma suposta busca por uma arma de fogo que estaria na residência, e durante essa “busca”, nenhuma arma foi encontrada. Durante a procura diversos móveis, eletrodomésticos e objetos da família foram destruídos.
As vítimas relatam, que durante a agressão o homem desmaiou e após voltar a si, os policiais voltaram a agredi-lo, depois seguiram com ele para um local indeterminado onde as agressões continuaram e somente após esses atos foi conduzido à delegacia do bairro Ouro Preto.
Tal ação é imensamente questionável e reprovável, uma vez que os policiais não apresentaram motivo concreto e coerente para justificar a abordagem, que se mostrou infundada tendo em vista que nenhuma arma foi encontrada. E diante da abordagem o emprego da força bruta por vários policiais contra dois homens desarmados, que poderiam ser facilmente conduzido sem qualquer necessidade de agressão, é prova de abuso explícito na ação. Além disso, a mulher relatou está com o seu bebê no colo e mesmo assim teve arma apontada para a cabeça, testemunhou palavras agressivas dos policiais e foi obrigada a acompanhá-los à delegacia, sem que nenhuma policial feminina estivesse presente durante a operação.
Também é extremamente grave o fato de que a ação violou mais de uma vez, as regras impostas a população durante o período de isolamento, primeiro devido ao excessivo número de agentes presentes no local, chegando a 8 viaturas e aproximadamente 32 policiais, onde vários deles entraram na residência onde se encontra uma pessoa idosa, pertencente ao grupo de risco para a COVID-19.
Essa abordagem só reforça o despreparo dessa força policial para lidar com a população. Ações como essa violam os mais básicos direitos de um indivíduo e ferem terrivelmente suas vítimas. É inaceitável que mais uma vez recebamos a denúncia de uma ação truculenta por parte do 2º BIESP, companhia que deveria ser referência em segurança para a população e tem sua imagem vinculada atualmente à violência, ao medo, principalmente nas periferias da nossa cidade.
A comissão de Direitos Humanos e Cidadania está dando a devida assistência às vítimas e reafirma seu compromisso de lutar pela garantia dos direitos do povo petrolinense e assegura que trabalhará para que todos os fatos sejam explicados e que os responsáveis arquem com as consequências de seus atos de violência. Aproveitamos para reiterar antigas solicitações de agenda com o Governo do Estado de Pernambuco, principalmente responsável por essa situação. Lamentamos, também, a falta de assistência social a essa família por parte do governo municipal. Esperamos que não sejam necessários novos atos de tamanha gravidade, ou pior, para que providências urgentes e necessárias sejam tomadas para a superação dos frequentes atos de violência policial no nosso município.
Basta de violência policial!
As nossas periferias merecem mais respeito!”
Em nota, a Polícia Civil afirmou que foi instaurado inquérito policial “para apurar os crimes de desobediência, desacato e resistência, cometido por dois homens, 23 e 27 anos, em face aos policiais militares lotados no 2º Batalhão Integrado Especializado de Policiamento”. A nota ainda diz que o caso está sendo investigado pela 213ª Circunscrição de Petrolina.
Já a Polícia Militar disse que, “de acordo com o comandante do 2º BIESP, policiais militares estavam em rondas, na última segunda-feira (6), para a captura de suspeitos de assaltos, no bairro do Sol e adjacências. Ao chegarem no bairro Vila Eulália, visualizaram um veículo suspeito, ao dar ordem de parada, o motorista não obedeceu. O efetivo fez o acompanhamento que só parou em frente a uma residência, ao desembarcar o condutor e passageiro não obedeceram a ordem para que fosse realizada a abordagem pelos PMs . Eles desacataram e agrediram o efetivo. Todos envolvidos, policiais e suspeitos, fizeram exame de corpo de delito e em seguida foram encaminhados para a Delegacia de Plantão para serem adotadas as medidas cabíveis”.
Ainda segundo o comando do 2º BIEsp, na ocasião, “um dos suspeitos teria adentrado na residência com um objeto na mão, envolto em um pano. Ao retornar para fora do domicílio, teria agredido um dos policiais, deferindo um tapa em seu rosto, sendo detido dentro da residência, em flagrante delito. Segundo o comandante da Unidade, será instaurado procedimento para apurar os fatos relatados”, finalizou.