Nesta terça-feira (19), a Professora do Colegiado de Psicologia da Universidade Federal do Vale do São Francisco, Dra. Bárbara Cabral, que representa o Núcleo de Mobilização Antimanicomial do Sertão (Numans), participou do Programa Preto No Branco na Transrio Fm.
A doutora falou sobre a decisão judicial que determinou à Associação Sanfranciscana de Assistência de Saúde Mental que interrompa a realização de novas internações no Hospital Psiquiátrico Nossa Senhora de Fátima, em Juazeiro.
Para Bárbara Cabral, “é fundamental aproveitar o momento dessa ordem judicial de interdição das internações na Clínica Psiquiátrica N. Sra. de Fátima e ampliar o diálogo com a população sobre o quanto a lógica manicomial é arcaica e precisa ser ultrapassada na prática. Como se diz no movimento social antimanicomial: o manicômio não cura, tortura,” avaliou.
Segundo a doutora, estudos indicam que o tratamento sem interrupção do convívio social é muito mais potente.
“Discutir que a Clínica Psiquiátrica precisa acabar significa defender o fortalecimento dos serviços territoriais da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), como os CAPS, a UPA, as unidades básicas, o SAMU, as residências terapêuticas, as unidades de acolhimento, a equipe de consultório da rua entre outros. Investir na RAPS é investir em políticas públicas, que devem reduzir os abismos sociais. Todo mundo merece um cuidado de qualidade, no território, em liberdade.”
Sobre casos em que a internação de pessoas em sofrimento psíquico seja indicada, Bárbara Cabral disse que “cada crise tem um caráter muito singular, que precisa ser avaliado caso a caso. Algumas situações de crise podem ser contornadas no próprio CAPS. Crises podem envolver sintomas diversos, como discurso acelerado ou mutismo, agitação psicomotora ou total paralisia, delírios persecutórios ou humor deprimido (com total desinvestimento nas atividades da vida). Enfim, é assunto complexo. A RAPS pode atender pessoas em crise no CAPS, em unidades da Atenção Básica, na UPA. Os encaminhamentos dependem de cada caso. Às vezes um período de observação na UPA, com posterior encaminhamento para o CAPS pode ser suficiente. O importante é investir no cuidado em rede,” orientou.
Ela também avaliou a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) em Juazeiro e região.
“Apesar de ter avançado, com a garantia de espaço próprio para o CAPS II e a implantação de novos dispositivos, como a Residência Terapêutica e a equipe de consultório na rua, outros investimentos são necessários, como a implantação de unidades de acolhimento, a transformação do CAPS II em 24 horas. Mas a rede avançou muito na capacidade de acolhimento às situações de pessoas com sofrimento psíquico e precisa ser mais conhecida pela população. Muita gente ainda não conhece o trabalho dos CAPS, por exemplo. Todos os municípios da Rede PEBA precisam investir no fortalecimento de suas Redes de Atenção Psicossocial e na implantação de leitos de Atenção integral em Saúde Mental nos hospitais gerais da região,” concluiu Bárbara Cabral.
Decisão Judicial
A Justiça acatou pedidos do Ministério Público estadual e determinou a interrupção de novas internações no Hospital Psiquiátrico Nossa Senhora de Fátima, em Juazeiro. A instituição terá que informar a origem dos pacientes já internados, de outras localidades, e comunicar aos municípios o prazo de 40 dias para que seja providenciada a entrega dos pacientes aos seus responsáveis. A decisão foi proferida na última quarta-feira (13), no processo da ação civil pública ajuizada pela promotora de Justiça Rita de Cássia Caxias de Souza.
Na decisão, o juiz José Goes Filho considerou os relatórios de inspeção realizados na unidade hospitalar em outubro de 2023 e neste mês de março apontados pelo MP, que constataram diversas irregularidades e violação a direitos dos pacientes. “Verifico que estão faltando insumos básicos no Hospital Psiquiátrico, bem como há um total descaso e desamparo com a situação dos pacientes internados”‘, afirmou.
Ele determinou ainda o bloqueio de regulações para a unidade pela Central Interestadual de Leitos. Entre as graves irregularidades constatadas pelas inspeções estão déficit na alimentação fornecidas aos pacientes (frutas e carnes), estruturas físicas danificadas, falta de limpeza nos refeitórios e incapacidade de fornecer vestimentas e medicamentos necessários.
Os problemas, destaca a decisão, persistiram mesmo após determinações liminares obrigando a solução urgente das inconformidades. O descumprimento da decisão pode ensejar multa diária de R$ 2,5 mil, sem prejuízo de instauração de procedimento para apuração de crime de desobediência.
Redação PNB



