“O gato Nelson Piquet”, por Mônica San Galo

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Antônio Maria Malan de Souza Dias, meu tio, conhecido por Malan de Petrolina. Uma criatura de bem com a vida. Daquele tipo de gente que não se aborrece com nada. Quando está muito aperriado das idéias vai dar uma volta de bicicleta, uma caminhada, vai conversar com um e com outro e volta novinho em folha.

Tem gente que é assim. Levinha. Tem a alma brincalhona, ri de si mesmo, se diverte com a vida, parece até que já nasceu sabendo que viver é isso, um estalar besta de dedos e puff!, cabou.

Pois Malan um dia achou um gato. Desses gatos perambuladores de rua. Feioso, magro, cheio de carrapichos, o gato era um traste véio mesmo. Até o miado, ao invés de ser soprano era tenor, de tanta fome que o coitado apresentava.

Se fosse outra pessoa teria passado ao largo do bicho. Mas Malan é desses que sabe que a vida é a alma e não o corpo. O corpo é apenas prum manejo mais confortável da alma. E o gatinho tinha uma alma esfuziante como a dele, Malan, uma alegria contagiante. Mesmo magrinho, feioso, faminto e sujo, era amigueiro e assim que recebeu o primeiro chamado foi logo fazendo festa no seu descobridor.

Malan levou o gato pra casa, tratou dele, alimentou, deu remédio pra curar vermes, deu banho, catou os carrapichos, fez festa na barriguinha e ficou muito amigo do bichano.

Mas o gato precisava de um nome. Naquela época o super piloto de Formula 1, Nelson Piquet, era patrocinado pela Parmalat, empresa de laticínios. O leite Parmalat de caixinha era o preferido do gatinho. Nada mais justo que dar-lhe o nome de Nelson Piquet. Ao menos foi essa a história que ele mesmo me contou.

E o gato Nelson Piquet foi ficando forte e destemido. O leite era bom e o bicho consumia caixas e caixas, deixando Malan tentado a pedir um pouco de patrocínio à Parmalat também, afinal tratava-se de divulgação poderosa, a julgar pela popularidade desse meu tio em terras sertanejas.

Um dia eu estava por aquelas bandas e dei um pulo em casa de Malan. Ele estava feliz da vida. Descobrira um talento pro gato e estava pensando até em ganhar algum dinheiro explorando essa potencialidade do amigo.

_ Gato talentoso, Malan? Que diabos um gato pode fazer além de companhia, miados, cocôs, e algumas unhadas..? Ah, e xixi de gato, que é um horror.

_ Não sabe? Então me empreste aqui essa sua pulseira. É ouro, não é?

_ Sim,

respondi, entregando-lhe a peça.

Ele então chamou Nelson Piquet e pôs a pulseira em torno do pescocinho do gato.

Esperei um tempo. O gato deu alguns passos preguiçosos em direção à cozinha, e logo sentou-se sobre as patas.

?

_ E ai, meu tio? Cadê a sabedoria do bicho?

E ele:

_ Calma! Você já vai ver.

E apanhou numa gaveta uma outra pulseira muito parecida com a que eu usava.

_ Está vendo isso aqui? Veja o que vai acontecer.

E tirou a minha pulseira do pescoço do animal, pondo em seguida a outra.

Fiquei perplexa!

O GATO NELSON PIQUET COMEÇOU A ANDAR EM MARCHA-À- RÉ!!!

Não havia nada que pusesse o gato no rumo certo, andando para a frente!

_ O QUE VOCÊ FEZ AO GATO? _ Perguntei.

E Malan, com a cara mais de quem havia descoberto a pólvora, me disse, cheio de orgulho:

_ Nelson Piquet só anda pra frente se a peça for em ouro legítimo.
Se for Micheline ( um tipo de bijouteria folheada a ouro, muito em moda nos anos oitenta ) ele reconhece na hora e passa a andar de ré. Só volta a andar normal, para a frente, quando eu tiro a pulseira do pescoço dele, quer ver?

E assim ele fez. O gato voltou ao normal.

E eu nunca mais voltei ao normal depois de assistir a essa cena.

Pensam que é mentira?

Quem me dera.

E mais não digo.

Por Mônica San Galo

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