Desde os tempos antigos, os gestos possuem significados simbólicos que ultrapassam a mera comunicação. Em Roma, por exemplo, o polegar para cima e para baixo era associado ao destino dos gladiadores. Contrariando o senso comum moderno, há historiadores que argumentam que o polegar para cima indicava um golpe fatal, enquanto o polegar para baixo simbolizava a clemência, ou ainda um comando para que o derrotado largasse a espada. Esse poder dos gestos, de representar vida e morte, se manteve ao longo da história e foi ressignificado em diversos contextos.
No século XX, regimes totalitários também utilizaram gestos como símbolos de controle e ideologia. Primeiro com Benito Mussolini na Itália e em seguida também o nazismo alemão se apropriou da saudação romana, estendendo o braço direito para frente como símbolo de lealdade a Hitler (Sieg heil). Esse gesto tornou-se um ícone da opressão nazista e, posteriormente, foi banido em diversas nações. A capacidade de um simples gesto se tornar um identificador ideológico demonstra o poder simbólico das expressões corporais ao longo da história do mundo.
Os exércitos, ao longo da história, também desenvolveram gestos próprios para reforçar hierarquia e disciplina. A continência, por exemplo, surgiu como um gesto de respeito e submissão entre os cavaleiros medievais, possivelmente originado do ato de levantar a viseira do capacete. Com o tempo, tornou-se uma saudação formal nos meios militares em todo o mundo, representando honra e obediência. Além disso, gestos manuais são amplamente usados para comunicação silenciosa em operações estratégicas.
Nos dias atuais, no Brasil, o uso de gestos simbólicos é também uma ferramenta de poder instituída pelo chamado ‘estado paralelo’, controlado pelo crime organizado. Facções criminosas estabeleceram códigos gestuais próprios para identificar seus membros, expressar ameaças ou reforçar sua presença em territórios dominados.
Muitas vezes, sinais manuais servem para indicar afiliação a uma facção ou demonstrar domínio sobre determinada área, criando um sistema de comunicação que substitui as instituições estatais fragilizadas pela corrupção e pela incapacidade governamental de lidar de forma mais eficiente com este Hecatombe moderno que afeta principalmente as classes mais baixas. Há aí um recorte de classe e também de cor, afinal são os jovens negros e periféricos que são arregimentados pelas facções para lutar em uma guerrilha urbana onde só morte sai vencedora.
A apropriação da simbologia dos gestos pelo crime organizado evidencia o enfraquecimento do Estado na manutenção da ordem pública. Quando a população se vê forçada a reconhecer e respeitar esses sinais como forma de sobrevivência, percebe-se que a linguagem corporal, longe de ser apenas uma expressão espontânea, pode se transformar em um instrumento de dominação ou resistência.
Dessa maneira, a simbologia dos gestos atravessa os séculos, adaptando-se às realidades sociais e políticas de cada época. Do Coliseu romano às periferias brasileiras, os gestos continuam a carregar significados profundos, sendo utilizados tanto para consolidar poder quanto para desafiar e intimidar sistemas estabelecidos.
Por João Gilberto Guimarães Sobrinho, juazeirense, produtor cultural, cientista social formado pela Universidade Federal do Vale do São Francisco, Pós graduando em Políticas Públicas e direitos sociais, pesquisador das Políticas Públicas de Cultura
Belíssimo texto. Parabéns!