A trágica morte de uma estudante, mãe de 2 filhos, que estava no último ano do curso de medicina da Faculdade Estácio, em Juazeiro, na região Norte da Bahia, ocorrida nesta semana, gerou forte comoção entre alunos, que alertam sobre as condições de saúde mental dos estudantes, principalmente dos que estão finalizando a formação, os chamados internos. Após o ocorrido, eles enviaram ao Portal Preto no Branco uma série de relatos que denunciam um ambiente acadêmico adoecedor, supostamente marcado por pressão excessiva, silenciamento e negligência institucional.
“A formação médica da Estácio, em Juazeiro, está adoecendo os seus estudantes. A morte da estudante de medicina em internato que ocorreu ontem, por si só, já deveria ser motivo de luto coletivo, de reflexão profunda e de ação imediata. Mas, mais do que isso, é o retrato de um sistema que vem falhando repetidamente com seus alunos, empurrando-os para o limite da saúde mental e fingindo que isso é parte do processo formativo. Denunciamos aqui a cultura institucional que normaliza o sofrimento, ignora sinais de esgotamento, e silencia qualquer pedido de ajuda. Um sistema que exige presença total, desempenho impecável e resistência absoluta, mas que não oferece escuta, acolhimento ou suporte psicológico adequado. Denunciamos o fato de que estudantes têm adoecido em silêncio, enfrentando jornadas desumanas, abusos de autoridade, humilhações públicas, medo constante de represália — tudo isso sem qualquer rede efetiva de proteção. Denunciamos a naturalização da exaustão e do colapso psíquico como “parte da rotina médica”. Denunciamos, também, a ausência de políticas reais de saúde mental para alunos em formação, a inexistência de protocolos eficazes de acolhimento em situações de crise, e a negligência institucional diante de denúncias de abuso psicológico e moral no ambiente hospitalar”, declarou um grupo de estudantes. Temendo represálias, eles preferiram não se identificar.
Eles destacam ainda que a situação vivenciada pelos estudantes não pode ser naturalizada e exige que medidas urgentes sejam adotadas para mudar o cenário.
“É urgente dizer: isso não é normal. Isso é violência. Não é normal chorar escondido no banheiro de um hospital. Não é normal ter medo de admitir sofrimento. Não é normal adoecer em silêncio com medo de parecer fraco. Não é normal que a formação médica custe a vida de quem sonha em salvar outras. Quantas mortes mais serão necessárias para que sejamos tratados com dignidade? Hoje, a dor tem nome. E o silêncio institucional não pode continuar sendo a resposta. Exigimos da universidade, dos hospitais e de todos os profissionais envolvidos compromisso real com a saúde mental dos alunos. Exigimos estruturas de escuta, acolhimento, canais de denúncia efetivos e mudanças concretas nas condições de formação. Não aceitaremos que mais uma vida seja apagada em silêncio. Hoje falamos em nome de todos que estão sofrendo, calados, dentro de um sistema que precisa mudar. Que essa morte não seja mais uma estatística. Que seja o fim do silêncio”, acrescentou.
O grupo classificou o ambiente da faculdade de medicina Estácio como “hostil”, de “medo” e “pressão constante”.
“O que ocorreu com a aluna não foi apenas uma tragédia individual, mas o reflexo de um ambiente hostil, de uma cultura acadêmica que adoece seus alunos. A faculdade se tornou um lugar em que o medo e a pressão constantes se sobrepõem ao cuidado e à empatia. Profissionais que deveriam nos orientar e nos formar como médicos e como seres humanos preferem humilhar, ignorar ou pressionar. Não há espaço para falar sobre sofrimento, para pedir ajuda ou para dizer que algo não está bem. Durante os rodízios, sequer podemos reclamar ou agradecer. Somos constantemente lembrados de que qualquer manifestação de insatisfação pode ser punida. Os coordenadores não gostam que a gente demonstre vulnerabilidade, é melhor ficar em silêncio do que arriscar a fúria de quem manda”.
Os universitários destacaram ainda que é necessário perceber a existência de um problema estrutural na faculdade, para que outros casos como a da aluna Cristina Carneiro voltem a acontecer.
“É revoltante que tenha sido necessário chegar ao ponto de uma vida ser perdida para que, talvez, alguém pare e perceba que existe um problema estrutural: a formação médica está matando seus alunos. Uma cultura de medo, de hierarquia tóxica e de desumanização que cobra sem ensinar, que pune sem escutar. Nós não podemos normalizar isso. Não podemos aceitar que seja assim. Uma vida perdida não pode ser apenas mais um número. É urgente que mudemos a forma como cuidamos de quem escolheu cuidar de vidas”, desabafaram.
Estamos encaminhando os relatos e denúncias para a Faculdade de medicina Estácio, em Juazeiro, em busca de esclarecimentos.
Redação PNB