Ocupação na ponte: Sagrados são os direitos de ir, vir e se manifestar

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Não é de hoje que a Ponte Presidente Dutra, que liga os estados da Bahia e de Pernambuco, é palco de manifestações sociais e políticas dos movimentos organizados de Juazeiro e Petrolina. No final da década de oitenta, ainda com os resquícios da ditadura militar, a ponte parou para ouvir o pedido de socorro ao Rio São Francisco, feito pelo Movimento de Defesa do Rio São Francisco, integrado por ambientalistas, estudantes, professores e outros poucos engajados na causa ambiental e reativos a contaminação das águas por agrotóxicos. Desse eu me lembro bem.

De lá pra cá outras causas, outras lutas, outras bandeiras e pautas ocuparam a ponte, na tentativa de chamar atenção para as angústias, usurpação de direitos, injustiças, desmandos políticos, autoritarismo e descasos de toda sorte.

Os trabalhadores rurais sem terra e assentados já deixaram por lá o rastro da sua luta; Os caminhoneiros também; Em reação a ocupação da Ilha do Fogo pelo exército, na calada da noite, a juventude (sempre a juventude …), não teve lugar melhor para dizer que a “ilha do fogo é do povo”, senão a ponte que une as duas cidades; A juventude de Juazeiro e Petrolina (sempre a juventude …)fez um “abraçasso” no meio da ponte defendendo a democracia e alertando para um golpe que se anunciava;

Mais recentemente, a sede de justiça para o caso Beatriz Mota, assassinada, até agora impunemente, aos 7 anos de idade, levou familiares e amigos a derramarem sua dor na ponte; Os vaqueiros aboiaram na ponte pela vaquejada legal. Por último e por sorte, a juventude(sempre a juventude …)se rebelou pacificamente contra um retrocesso de 20 anos, a tal Pec 241, enchendo a ponte de esperança e bravura.

A Ponte Presidente Dutra transformou-se na ponte das lamentações e lutas do povo ribeirinho, assim como a Avenida Paulista, em SP, a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, a Cinelândia, no Rio de Janeiro e tantos outros espaços públicos e emblemáticos nos brasis da resistência. Espaços do povo. Arenas do povo. Mas que povo é esse? O povo que ocupa a ponte pensando no povo que passa por ela como pela vida passa. Alheio ao que é comum.

Centrado no próprio umbigo. Cético. Apático. Tão vítima do mesmo sistema, que por achar que não consegue vencê-lo, une-se a ele. O povo que se acovarda, porque faz medo mesmo, cada dia mais, enfrentar os podres poderes. É assustador! O povo que ocupa a ponte e protesta sempre existiu e há de sempre existir, para o bem do povo que tem pressa em atravessar, que se irrita com a demora, se revolta com o transtorno imediato do engarramento e atraso nos compromissos. O povo que ocupa a ponte tem o direito constitucional de protestar.

O povo que não ocupa a ponte tem o direito constitucional de ir e vir. E quando os dois preceitos constitucionais se chocam, não se pode escolher um em detrimento do outro. Eles têm o mesmo peso. Quando se fecha uma via, há de se buscar outras alternativas. Um pouco mais de paciência, de barquinha e caminhada, de envolvimento, de compreensão coletiva. Há de se encontrar um equilíbrio e salvaguardar as emergências. Sem abusos. Sem intolerância. Se a causa é justa, é social, é coletiva, se a manifestação é pacífica, então é inteligente, democrático e fraterno que a comunidade apoie.

Os direitos de ir e vir e de se manifestar são sagrados. A Constituição, conquistada em 1988, depois de muita luta e sob protestos, também na ponte, garante o direito de manifestação com prévio aviso. Eu falei A CONSTITUIÇÃO”, a carta magna, essa que assegura todos os direitos de todos os cidadãos e cidadãs brasileirxs. E ainda tem quem diga que “esses movimentos não levam a nada”.

A ponte é testemunha. E bem que poderia se chamar também de ponte da liberdade. De ponte da resistência. Por onde passaram muitas águas. Por onde muita água ainda vai passar. Com fé na juventude e no povo brasileiro!

Colhemos opiniões nas redes sociais e fizemos contato com alguns jornalistas e radialistas da região. Veja o que dizem também sobre as ocupações na ponte Presidente Dutra :

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JOTA MENEZES

“Não concordo com essa campanha, penso que as pessoas tem o direito de protestar pacificamente em lugar público, da mesma forma que tem direito de ir e vir, claro, respeitando os eventos excepcionais como por exemplo a livre passagem de ambulâncias, corpo de bombeiros, etc e tal…Qualquer manifestação pública resulta de um incômodo e geralmente diz respeito à causas de conotação social e portanto de interesse público.o fato da maioria delas no Polo petrolina-Juazeiro ser realizada na ponte, obviamente tem um objetivo claro: chamar a atenção das autoridades constituídas e da sociedade para algo importante, não é simplesmente por um desejo de anarquia, pois certamente quem está no movimento também vez ou outra é incomodado com engarrafamentos, etc…As pessoas tem o direito de reclamar, dizer o que pensam, só não podem querer impedir que as pessoas se manifestem onde elas quiserem (claro, repito, respeitando sempre o Estado de Direito, o patrimônio público e os outros que não querem se manifestar) . Me preocupa que posturas assim (o de proibir a manifestação na ponte) sejam confundidas com autoritarismo e imposições verticalizadas. daqui há pouco você vai ter que pedi licença para tudo, inclusive do lugar para se manifestar”.
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CARLOS LAERTE
“A primeira vez que a ponte Presidente Dutra foi ocupada por um protesto, em fevereiro de 1984, gritávamos contra o vinhoto lançado criminosamente nas águas do rio São Francisco. Para protestar contra este que é considerado o maior desastre ambiental do Vale do São Francisco, Petrolina e Juazeiro se uniram num abraço simbólico. Participei deste e de alguns outros atos na ponte, mas acredito que a repetição continua e exagerada desta iniciativa vem transformando o ato num desagrado geral. Por um direito garantido, muitos outros são usurpados. Que continuemos protestando, sem prejudicar aqueles que certamente nos apoiam”.
MARTA LUZ
“A ponte é do povo: não é de autoridade nenhuma. A ponte é do povo, como a praça e as ruas. É pela ponte que escoa o capital dessa região, portanto é nela que os estudantes têm de manifestar seu repúdio a uma PEC tão maléfica e prejudicial ao povo brasileiro e manifestar, também, oposição ao MEC nessa sua perseguição ditatorial aos estudantes. Mantenham-se firmes, você jovens com mentalidade jovem!Muita coragem a vocês, jovens esclarecidos, para lutar contra as absurdas arbitrariedades desse governo anti-povo. Parodiando Castro Alves cantem, alto e bom som: A PONTE É DO POVO!! Essa luta dos jovens estudantes é tão salutar e bonita luta!!!”.
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EDENEVALDO ALVES
“Eu já tinha levantado essa questão na semana passada no meu programa quanto a paralisação dos vaqueiros. Eu penso assim, a ponte é o único elo de ligação entre as duas cidades. Eu faço uma pergunta: qual foi a manifestação na ponte Presidente Dutra que resolveu problema? Nenhuma até hoje, aí vão os apaixonados por vaquejada e fecham a ponte em protesto, porque vaquejada gera emprego, vaquejada mexe com a economia, e fechar a ponte também não para a economia das duas cidades, em todos os setores? O que que vai resolver? O protesto na ponte vai trazer de volta a decisão do STF? Qual era o lugar ideal? Em Brasília, no congresso nacional, no gabinete de Temer, no superior tribunal que foi lá que saiu a decisão, não aqui para mexer com minha economia, mexer com o bolso do trabalhador, com o comerciante que já vive um sufoco terrível. Eu não aceito isso, isso me doí. Qualquer movimento que tiver na ponte não tem meu apoio e pode fazer uma pesquisa, a sociedade na sua maioria absoluta não apoia essa história de fechar a ponte. Agora recentemente foram os estudantes da Univasf conta a Pec 241. Vão a Brasília, vão para o congresso nacional. Foi lá, é lá onde saiu tudo isso, essa decisão. Pressionem os deputados, fechando a ponte aqui vai resolver pelo amor de deus? Vai piorar, já que a PEC mexe com a economia, estabiliza investimentos, fechar a ponte também provoca isso, estabiliza nossa economia, para a nossa economia. Porque o comerciante não tem condições de atravessar para fechar negocio de um lado ou de outro e qualquer outro profissional. Então não adianta, não tem meu apoio, discordo e discordo mesmo, a não ser que me provem o contrario”.
Por Sibelle Fonseca

1 COMENTÁRIO

  1. Não concordo com fechamento de ruas, rodovias, pontes entre outros, para fazerem seus protestos, se quiser incomodar vá procurar quem está lhe incomodando. Outra coisa que não aceito é o fato de muitos discordarem da PEC 241, essa emenda simplesmente impede que governantes não gastem além do que arrecada.

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