“Misoginia na Música Popular Brasileira”, por Paula Grave

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Em pleno século XXI, nós mulheres ainda somos alvo da visão estereotipada do homem e, essa situação vem se arrastando ao longo das décadas. Não há como negar que a história da humanidade desde os primórdios, aponta para uma representação construída onde a mulher para ser valorizada, precisa arrancar suspiros e, deve ser “prendada”. Quando as mulheres não estão “enquadradas” nesse modelo, passam a ser alvos de cantadas pejorativas e objetificadas.

Há quem diga que esse tempo ficou para trás, mas, estamos longe disso, e, aqui destaco uma citação da autora de “Selvática” (2015), Karina Bhur “o contexto sempre foi o mesmo, homens oprimindo mulheres, não muda nada a respeito da gravidade das letras escritas, elas eram muito machistas e misóginas e seguem sendo”.

Considerando a mudança do atual momento para o passado, hoje vivenciamos um contexto em que as mulheres ocuparam mais espaço para expressar a sua voz, anteriormente havia um incômodo individual longe de ser expressado, e, por esta razão não possuía forças para se produzir o espaço de fala sobre a dor de forma aberta, hoje, o discurso individual, tornou-se um movimento político/social e cultural onde é possível construir reivindicações e algumas conquistas. As mulheres começam a expressar seu inconformismo e indignação com a naturalização das palavras que lhe são endereçadas, palavras essas que “coisifica” a mulher.

Aos misóginos, e aí me permita inferir que se trata de uma aversão “patológica” às mulheres, levando-as a um nível fantasioso ao seu bel prazer, este, que chamamos de “falocentríco”, denotando perturbação no equilíbrio psíquico. Do ponto de vista psicanalítico pessoas com tais características sofreram possivelmente algum tipo de negligência em sua infância quanto aos cuidados maternos.

Sabemos que a música brasileira, dos mais diversos gêneros, está permeada por discursos machistas que incitam a violência e ratifico (todo tipo de violência, a psicológica, discriminativa, sexual, intelectual, etc) contra a mulher. Ainda que saibamos que grandes nomes da MPB como Martinho da Vila, Noel Rosa por exemplo cantaram músicas com letras que desqualificaram a mulher, agressão velada sob forma de “poesia”, e no contexto atual os autores/ compositores e músicos permanecem reproduzindo esse comportamento machista.

De forma geral é possível nos deleitarmos em interpretações psicanalíticas acerca de algumas letras de músicas que na atualidade é explicitada de forma naturalizada, porém, são banquetes quando nos referimos a estudos contemporâneos.

– A maioria das letras que estão sendo cantadas e cantaroladas, sugere uma demonstração de poder sobre a mulher, incitando a violência e “demarcando um território” que julga ser seu, (a mulher);

– Outro aspecto observado nas músicas, remete a um quadro que chamamos de pulsão sadomasoquista, ou seja, infringir dor física ou moral no outro por absoluto prazer, o que caracterizado como uma parafilia e, segundo a visão psicanalítica isso é resultado de uma situação traumática vivenciada na infância, onde na vida adulta, inconscientemente somos tendenciosos a repetir as falas de nossos pais quando nos infringiam dor física com palmadas ou com objetos “corretivos” (chamamos de compulsão à repetição), nesse contexto, escapa do inconsciente a frase ouvida muitas vezes enquanto acontece a “correção” bato em você por que te amo e quero o seu melhor;
Percebe-se também em sua grande maioria um narcisismo patológico, deflagrando o seu alter ego, e no contexto a que estamos nos referindo podemos denomina-lo de supremacia masculina;

– E, por último, mas, não menos importante, a objetificação da mulher de forma explícita e desqualificada, além de diversas formas de discriminação em relação ao seu estereótipo, bem como incitando a violência psicológica, moral e física.

Muitas outras leituras acerca do assunto podem ser vislumbradas através do olhar da Psicanálise, mas, isso, falaremos em um outro momento.

Paula Grave é psicanalista (CNP 61.856-1), psicopedagoga (CBO 2394-25), Teórica em Psicanálise, presidente do Instituto Psicanalítico Bergasse, membro da AFPEH (Association Française de Psychanalyse Evolutiva et Humaniste), membro da ABP (Academia Brasileira de Psicanálise – CPP/PE. 10.027), especialista em diversas áreas de Saúde Mental e Educação, mestre em Ciências da Educação, acadêmica de psicologia, consultora e conferencista.

fotos ilustrativas

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