Infectologista fala sobre colapso do sistema de saúde e alerta importância do distanciamento social na região: “ou entendemos isso ou começaremos a assistir óbitos em série”

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O que os especialistas previam, está acontecendo: a curva de infectados segue em ascensão no Brasil. Em cerca de dez dias, o país saltou de 19.638 casos confirmados, conforme boletim divulgado pelo Ministério da Saúde no dia 10 de abril, para 40.581 casos, segundo dados de ontem (20). Um aumento de mais de 100%. O número de mortos também teve um crescimento exorbitante: saltou de 1.056 para 2.575, em cada data, respectivamente.

O temor, portanto, aumenta cada vez mais. Há exatamente um mês, o então ministro da Saúde, Henrique Mandetta, alertou, durante uma coletiva de imprensa: “O sistema de saúde entrará em colapso no final de abril”. Ou seja, quando se pode ter dinheiro, plano de saúde e até mesmo ordem judicial, mas simplesmente não há sistema para atendimento. Essa situação já está próxima de acontecer em alguns estados.

As unidades de terapia intensiva (UTI) de Manaus já estão quase no limite de atendimento. Por falta de vagas e de pessoal, os hospitais já não conseguem atender todos os pacientes. O governo do estado declarou que o sistema de saúde do Amazonas está entrando em colapso. No Ceará, 100% das vagas de UTI estão ocupadas e o número de leitos também está perto do limite. Em Pernambuco, segundo o secretário de Saúde do estado, André Longo, 99% dos leitos de UTI da rede pública dedicados aos pacientes infectados pelo novo coronavírus também estão ocupados.

(foto: arquivo)

O médico infectologista Washington Luís, que integra o Comitê de Prevenção e Enfrentamento à Covid-19 e ao H1N1 de Juazeiro, alerta que o país está se aproximando “da situação mais catastrófica e temida da covid-19”, que é o encharcamento do sistema de saúde.

“Essa é a condição mais temida. Anteriormente as pessoas atacavam os meios de comunicação dizendo que os dados eram infundados, que havia uma perseguição política, mas nós vamos começar a assistir, nos próximos dias, uma ascensão desenfreada do número de óbitos. O que mais temíamos, vai começar a acontecer, infelizmente. E esses óbitos, em sua grande maioria, não irão acontecer, principalmente, pelos pacientes com a covid-19, mas sim da população [em geral] que ficará desassistida com doenças do dia-a-dia, como asma, crise hipertensiva, infarto, AVC. Não vão morrer não é porquê a doença não tem tratamento, mas sim porque não teremos como atendê-las. E não teremos como atendê-las porque a população, por muitos momentos, rejeitou a ideia de permanecer em casa. Temo, nos próximos dias, pelos meus colegas que estarão na linha de frente, tratando dos doentes, e que terão que fazer escolhas muito difíceis”, alertou o especialista.

O infectologista reforçou ainda para o risco de contaminação dos profissionais de saúde, o que pode agravar ainda mais a situação. “A gente sabe que muitos profissionais de saúde irão adoecer, tornando o sistema de saúde ainda mais fragilizado. Com menos profissionais, poderemos até ter leitos de UTIs e intermediários disponíveis, mas não [teremos] equipe necessária disponível para atender esses doentes. Em determinado momento assistiremos também a acensão de óbitos por doenças não covid-19 e doenças covid-19”, afirmou Washington Luís.

A contaminação dos profissionais também já é uma realidade. Na Bahia, por exemplo, no boletim de ontem (20), a Secretaria Estadual informou que, dos cerca de 1.300 casos confirmados, 157 são profissionais de saúde. No Distrito Federal, que possui 879 casos, 14% dos infectados são profissionais de saúde, segundo a secretaria. Na semana passada, uma reportagem exibida pelo Fantástico, da Rede Globo, mostrou que quase 7 mil profissionais, entre médicos, técnicos de enfermagem e enfermeiros, foram afastados do trabalho desde o começo da pandemia por apresentarem sintomas suspeitos. Entre os que conseguiram fazer o teste, pelo menos 1.400 estavam infectados, e 18 deles morreram de covid-19.

Distanciamento e isolamento social – Para o médico especialista, nesse momento, os municípios se sentem fragilizados tendo em vista a debilidade da rede de saúde SUS. “É um sistema frágil e que vem sendo deteriorado há anos, e não serão ações imediatas, em um intervalo de tempo lento, que irá resolver esse problema”, considerou.

Portanto, diante do cenário preocupante de risco de colapso, o especialista alerta que as políticas de isolamento e distanciamento não devem ser ignoradas. “Você que é jovem, você que não tem nenhuma doença, acredite, você pode adoecer, precisar de uma UTI, e se não tiver esse ambiente, você pode partir. Essa doença não é uma gripezinha, não é uma brincadeirinha. É um apelo que faço. Fiquem em casa” disse.

Situação no Vale do São Francisco – No dia 7 de abril, em entrevista ao PNB, Washington Luís afirmou que 50% da população do Vale do São Francisco deverá ser contaminada pelo coronavírus. Na época, ele ressaltou que, somente após o ápice da doença na capital baiana, é que as atividades voltarão ao normal, gradativamente, em Juazeiro. Segundo o infectologista, apesar de, atualmente, ser uma doença predominantemente de metrópoles, o vírus vai circular, brevemente, no interior, inclusive nas cidades do Sertão do São Francisco, “mais cedo ou mais tarde” (link da matéria no final da reportagem).

O especialista alerta que, na região, no presente momento, não há risco de colapso. Entretanto, ressalta que caso a população insista pelo fim das políticas de distanciamento social, a situação pode se tornar real.

“Lembrem-se da fala do ex-ministro Mandetta, que viveremos tempos duros no final de abril para o início de maio. E o que queremos? Abrir o comércio, movimentar as pessoas nas ruas. Isso é uma atitude inadequada. Sabemos da necessidade dos empregos e socioeconômicas das pessoas. Pressionem o presidente, o governador do Estado, a ajudar o seu município. Atacar o gestor municipal não vai colaborar em absolutamente nada”, disse.

Na região sanfranciscana, Juazeiro confirmou oito casos da infecção. Petrolina possui 16 casos positivos para coronavírus, sendo que 8 foram confirmados através de testes rápidos feitos pela prefeitura e 8 diagnosticados através do exame realizado pelo laboratório do governo do estado. Curaçá também confirmou três casos da covid-19. Na região, vale lembrar, também há uma preocupação com os casos de outras doenças contagiosas. Juazeiro tem 18 casos confirmados de H1N1, incluindo dois óbitos registrados; já Petrolina, são 9 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), além de 1 óbito.

Juazeiro prorroga distanciamento e anuncia investimentos – O prefeito Paulo Bomfim (sem partido) estendeu as medidas de isolamento social até o dia 2 de maio. Com isso, permanecerão abertos somente estabelecimentos que oferecem serviços essenciais, conforme consta em decreto anterior. Além disso, determinou o fechamento das Feiras e Mercados, exceto o Mercado do Produtor de Juazeiro por tratar-se de uma central de abastecimento de alimentos. Também permanecem proibidos os cultos e celebrações religiosas presenciais.

A prefeitura autorizou a compra de 10 mil testes rápidos, mais EPIs e material de higienização para abastecer as unidades de saúde e pretende transformar a nossa UPA numa unidade exclusiva de tratamento do novo coronavírus. O prefeito disse ainda que também tem conversado com o governador Rui Costa (PT) para uma possível utilização da estrutura do Hospital de Oncologia.

Juazeiro conta com 10 leitos de UTI (sendo 2 com ocupação no momento) e 30 leitos intermediários (com 5 ocupações) no Hospital Regional. A gestão espera que seja autorizado o uso da estrutura da Unacon, onde tem capacidade para até 400 leitos.

Por fim, o médico reforçou a necessidade da população do Vale do São Francisco cumprir as medidas de distanciamento social. “Nós, ainda, temos tempo de fazer uma história diferente para nossa região. Parem de pressionar os prefeitos. Parem de querer abrir o comércio. Parem de querer fazer com que as coisas aconteçam achando que que todos têm controle. Ninguém tem controle sobre essa doença. A única forma de controlar é através do distanciamento social. Ou entendemos isso, ou começaremos também a assistir óbitos em série. Não sou eu quem estou falando isso. É a Organização Mundial da Saúde, é o Ministério da Saúde”, acrescentou o infectologista que integra o Comitê de Prevenção e Enfrentamento à Covid-19 e ao H1N1 de Juazeiro.

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Infectologista afirma que 50% da população do Vale do São Francisco deverá ser contaminada pelo coronavírus

Da Redação do PNB por Thiago Santos

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