Certa vez, ao lecionar para uma turma de alunos de uma escola estadual de Juazeiro, fiz a seguinte pergunta: “Vocês sabem quem é João Gilberto?” Um aluno foi categórico em responder: “É um prédio que tem um teatro!” Essa situação me fez questionar a relação da cidade de Juazeiro com sua própria história e como a nossa sociedade sabe pouco sobre si mesma. Muita gente transita pela Rua Juvêncio Alves sem saber que o Doutor Juvêncio foi um médico que participou da Guerra do Paraguai e voltou para Juazeiro para literalmente entrar para a história da cidade, quantos de nós já entraram no casarão de Miguel Siqueira (Museu regional) sem saber quem é o dito cujo.
Esse desconhecimento revela um problema profundo: o apagamento da memória coletiva. Juazeiro é uma cidade rica em história, cultura e personagens ilustres, mas suas próprias gerações parecem estar cada vez mais distantes desse legado. Isso não é culpa dos alunos, tampouco dos professores, mas de um sistema que falha em valorizar e ensinar a história local nas escolas municipais.
A educação tem um papel fundamental na formação da identidade de um povo. Quando os alunos desconhecem figuras como João Gilberto, que revolucionou a música mundial com a Bossa Nova, ou não sabem da importância do Rio São Francisco para a história e o desenvolvimento da cidade, estamos negando a eles uma parte essencial de sua própria identidade. A história de Juazeiro é entrelaçada com o rio, que não apenas forneceu sustento para as primeiras populações, mas também serviu como rota de desenvolvimento econômico e cultural.
A ausência de um ensino estruturado da história local também nos distancia do sentimento de pertencimento. O jovem que não conhece o passado de sua cidade cresce sem entender sua própria importância na construção do futuro. Ele não vê referências, não se identifica com os lugares que frequenta, e a cidade passa a ser apenas um espaço de trânsito, não de raízes. Isso afeta diretamente o desenvolvimento cultural e social da comunidade, pois é essa identidade local que nos une enquanto sociedade.
Juazeiro tem uma riqueza histórica incomparável. Desde as lutas por emancipacão política, lendas, cultura, até as grandes transformações econômicas proporcionadas pelo Rio São Francisco, há muito o que ensinar aos jovens. A cidade foi palco de momentos históricos, berço de artistas renomados e abrigo de personagens que ajudaram a moldar a cultura sertaneja, nordestina e brasileira. No entanto, essas narrativas estão sendo esquecidas, perdidas entre a falta de materiais didáticos adequados e um currículo escolar que prioriza conteúdos globais em detrimento da história regional.
É fundamental que a história de Juazeiro seja abordada de forma estruturada nas escolas municipais. Isso não significa reduzir o ensino de história geral, mas sim integrá-lo à realidade local. Os alunos precisam conhecer as figuras históricas que dão nome às ruas por onde passam, compreender o impacto do Rio São Francisco em suas vidas, conhecer os artistas, escritores, músicos e líderes que ajudaram a moldar a cidade. Só assim poderemos resgatar a memória coletiva e formar cidadãos que não apenas habitam Juazeiro, mas verdadeiramente pertencem e se identificam comela.
Não podemos permitir que o apagamento da história continue. Precisamos incentivar projetos pedagógicos que valorizem a cultura local, promovam visitas a espaços históricos, estimulem pesquisas sobre os personagens que marcaram a cidade e criem materiais didáticos que contemplem essa rica trajetória. A história de Juazeiro não pode ser apenas um detalhe esquecido em livros empoeirados, ela precisa estar viva na consciência de cada aluno, de cada morador.
Resgatar nossa história é resgatar nossa identidade. Se queremos um futuro em que Juazeiro seja respeitada e valorizada, precisamos começar pela educação. Afinal, um povo que conhece sua história constrói seu futuro com muito mais força e orgulho.
Um desafio para você caro leitor, sabe me dizer quem fez essa estátua aí da foto, quando foi feita e o que significa?
João Gilberto Guimarães, é cientista social formado pela Universidade Federal do Vale do São Francisco, pesquisador das políticas públicas de cultura, poeta, editor e fundador da editora CLAE, também escreve para o teatro, em parceria com o ator Elder Ferrari ganhou em 2020, o prêmio Respirarte da Fundação nacional das artes (FUNARTE), com o espetáculo Quebranto.
O MELHOR,DOS MELHORES
Juazeiro é uma cidade que aos poucos vai perdendo sua memória, sem querer comparar e já o fazendo, vejam a parte da Petrolina antiga que ainda preserva seus casario com suas cores e beleza secular. Aqui o quarteirão de casas antigas foi demolido para dar lugar as agências bancárias sem falar em outros lugares que aos poucos vão sendo modificados, vide o cais antigo. Logo, nossa cidade terá sua memória completamente apagada para as novas gerações.
Muito obrigado
Vc fez um relato muito bom que pena que poucas pessoas fazem essa leitura
Muito bom …o que pra mim foi um aprendizado e acho sim que deveria ser colocado no currículo escolar de todas as escolas.
Perfeito. Vejo nas escolas trabalhando Romero Britto, de Juazeiro??
Somos ricos de personagens que foram importantes para a construção física e artística da nossa cidade, mas que tão pouco se dá valor. Parabéns pela redação deste texto maravilhoso. Vamos cuidar da memória fragilizada dos nossos filhos.