“A Epidemia Silenciosa das Apostas: Um Clamor Pela Família Brasileira”, por Rivelino Liberalino

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Há uma epidemia devastadora que, aos poucos, vai se revelando em toda sua crueldade. Ela já não é tão silenciosa — basta olhar com atenção para enxergar suas marcas nas casas, nos rostos e nos lares brasileiros. Falo das apostas eletrônicas, as chamadas bets, que se espalharam como fogo em capim seco, consumindo o que há de mais sagrado: a família.

O cassino agora não está mais distante, nem exige viagem ou luxo. Ele cabe no bolso. Mora no smartphone. Está acessível 24 horas por dia, seduzindo com luzes coloridas e promessas de riqueza fácil. Nunca foi tão simples se perder — e nunca foi tão difícil voltar.

Antes, quem quisesse apostar precisava se deslocar até certos locais, alguns tolerados, outros clandestinos. Hoje, o jogo se infiltrou em nossas casas sem pedir licença. Não há mais porteiro para barrar a entrada. Está ali, ao alcance de um toque. E, junto dele, um vício devastador, capaz de sugar até a última gota de dignidade.

E o resultado? Salários inteiros evaporados em dias. Benefícios sociais destinados ao sustento familiar, transformados em fichas virtuais. Dívidas se acumulando como montanhas. Casais se separando. Pais e mães chorando o futuro perdido dos filhos. Pessoas boas tornando-se desonestas, vendendo o que não têm, mentindo para sustentar a compulsão.

Não é preciso ir longe para encontrar tragédias. Em nossa própria região, já presenciamos suicídios motivados por dívidas de apostas. Um jovem, cheio de vida, viu-se preso em um labirinto sem saída. Um caso que nos fere, nos envergonha como sociedade e que deveria nos fazer acordar.

Ao mesmo tempo, cresce uma legião de influenciadores digitais que ostentam ganhos milionários e vendem a fantasia da vitória fácil. São os novos sacerdotes do bezerro de ouro, ensinando a adorar o dinheiro acima de qualquer valor, a celebrar o ter em detrimento do ser. Pessoas que lucram incentivando a destruição silenciosa de quem os segue.

E tudo isso num país que nunca soube ensinar educação financeira. Um país em que grande parte da população vive com um salário mínimo, muitas vezes escravizada em dívidas, aprendendo a ver o jogo como solução mágica, como esperança vã.

Vivemos uma sociedade desconectada — ainda que hiperconectada por telas. Famílias que se sentam à mesa sem se olhar nos olhos, cada um prisioneiro do próprio celular. Conversas interrompidas por notificações. Afeto substituído por curtidas. E nesse vazio, essas armadilhas encontram solo fértil.

Por isso, deixo aqui não apenas uma crítica, mas um apelo. Um clamor. Um pedido para que todos nós — pais, mães, irmãos, amigos — reflitamos com honestidade. Para que alertemos uns aos outros. Para que exijamos responsabilidade daqueles que promovem e lucram com essa epidemia.

É hora de retomarmos o que há de mais humano: a conversa verdadeira, a escuta generosa, o trabalho honesto, o cuidado com quem amamos. Precisamos relembrar que riqueza de verdade não se constrói em horas, mas em anos de esforço, ética e propósito.

E talvez devamos agradecer a Deus pelas graças que Ele nos nega. Porque muitas vezes, na Sua sabedoria, Ele nos poupa do peso que não estamos prontos para carregar.

Que cada um de nós tenha coragem de olhar para si, para a sua casa, para os seus filhos e perguntar: o que estamos ensinando? O que estamos tolerando? Em que tipo de mundo queremos viver?

Não precisamos de mais ostentação. Precisamos de mais base. De mais verdade. De mais amor.

Que essa reflexão encontre morada no coração de quem precisa. Porque ainda há tempo de mudar. E esse tempo é agora.

Rivelino Liberalino, advogado

8 COMENTÁRIOS

  1. Perfeito o texto, como todos os textos escritos por Rivelino Liberalino. Exatamente assim está acontecendo, só sabe quem passa, conheço uma família que todos já estão endividados arrumando dinheiro pra pagar os estragos feitos por uma única pessoa da família que começou com o jogo virtual muito conhecido. Eu conversei pessoalmente e perguntei como foi que começou e ela disse que é algo vicioso, difícil de libertar, a pessoa joga um pouco e ganha um valor razoável e não quer mais parar na expectativa de ganhar mais, jogava o que tinha e começou a pegar emprestado pra jogar mais, pegava o dinheiro de pagar as contas e jogava tudo. Contraiu tantas dívidas que passou a ser ameaçada por credores e a família teve que ajudar sanar as dívidas e evitar o pior.

  2. Muito boa sua iniciativa de abrir os olhos para essa epidemia silenciosa e destrutiva que assola o país. Assim como os grupos formados pelo AAA e outros anti-drogas, está na hora dessas entidades se voltarem para o vício das apostas. Tem muitas pessoas precisando de ajuda terapêutica

  3. Meu irmão Rivelino, por mais pessoas como você, para mostrar essa realidade silenciosa. Conte comigo sempre para levar essa mensagem e outras para quem precisa de ajuda, nós dos jogadores anônimos se sentimos abraçados com sua crônica, mais uma ferramenta para mim, ajudando minha recuperação, não tenho dúvidas que também está sendo de outras pessoas

  4. Como canta Silvio Brito: “Pare o mundo que quero descer…”
    Ótima reflexão, Riva
    Que o Bom e Amável Deus continue te acumulando de inspiração…

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