Ao longo da história do Brasil, as mulheres negras foram fundamentais para a evolução da sociedade, nas diversas áreas. Elas contribuíram para o desenvolvimento do conhecimento, da cultura, da economia, da política e movimentos sociais. Além do racismo, a misoginia e a desigualdade de oportunidades foram barreiras quase que intransponíveis para que elas pudessem atuar com liberdade, autonomia e protagonismo.
É impagável a dívida histórica que o Brasil tem com a população negra, e sobretudo com as mulheres negras, invisibilizadas, silenciadas, consequências da herança escravocrata.
Na escola se estuda os vultos, heróis e heroínas, ainda que raras, brancos. Pouco se fala sobre a memória negra do país além da escravidão. No que tange as mulheres negras é ainda mais grave, pois elas não aparecem nos livros, nas aulas, e até mesmo os professores desconhecem suas contribuições.
Neste 20 de Novembro, em que se comemora o Dia da Consciência Negra, o Portal Preto No Branco resgata a história de algumas mulheres que dedicaram suas vidas para mudar a história do Brasil.
Resgatamos alguns nomes entre os tantos que contribuíram e contribuem, de forma anônima ou de destaque, na luta por igualdade de direitos e na conquista de espaços para as mulheres brasileiras.
Dandara
Dandara, mulher negra e guerreira é um dos principais nomes da luta negra no Brasil. Teve papel fundamental na construção e comando do quilombo dos Palmares, um dos marcos da resistência contra o regime escravocrata brasileiro, que existiu e resistiu como quilombo por mais de 100 anos.
No quilombo de Palmares, Dandara participou do estabelecimento do primeiro estado livre nas terras da América, um estado africano pela forma como foi organizado e pensado, tanto do ponto de vista político quanto militar, sociocultural e econômico.
Companheira de Zumbi, Dandara foi mãe de Aristogíton, Harmódio e Motumbo.
Sua vivência enquanto mulher negra e de luta lhe caracterizou a alcunha de guerreira, visto que, além de dominar técnicas de capoeira, também lutou junto aos cerca de 30 mil aquilombados, comandando o exército palmarino. Em Palmares teria chegado menina, tendo participado além da resistência, nas atividades cotidianas como caça e agricultura.
Não há registros da origem de Dandara. Sua ascendência e local de nascimento são incógnitas, mas acredita-se que tenha nascido no Brasil e se estabelecido em Palmares ainda nova.
Sempre guiada pelo ideal de liberdade e em defesa do Quilombo que durou mais de 100 anos, Dandara foi contrária a um tratado de paz proposto pelo Governo Português, por encontrar nele caminhos para a volta da escravidão. Dandara sabia que o tratado poderia significar o fim do Quilombo e o retorno da escravização de sua comunidade assim, não se vendeu em troca de uma liberdade incompleta e manteve-se firme em sua ideologia até seus últimos dias.
Dandara dos Palmares é mais uma mulher negra apagada pelo machismo e racismo, sua vivência negava o lugar social destinado para as mulheres e negras tanto na época em que viveu como hoje em dia, sua luta contra as raízes da opressão traziam extremo incômodo para a sociedade. A líder e guerreira tem sua imagem frequentemente lembrada sob a sombra de seu marido, Zumbi.
Há relatos de que ela tenha se suicidado, pulando em uma pedreira após ser capturada em 06 de fevereiro de 1694. Preferia a morte a voltar a ser escrava. Se vivesse nos tempos atuais, provavelmente incomodaria muitas pessoas que se negam a enxergar o machismo racista estruturante da sociedade.
Apesar das lacunas na sua história e imagem, Dandara vive em cada um de nós que luta por liberdade e por uma vida mais digna e justa.
Tereza de Benguela
Tereza coordenou o Quilombo do Quariterê, maior quilombo do Mato Grosso. Apesar de existirem diversas versões sobre sua história, sabe-se que seu quilombo abrigava mais de 100 pessoas. Ficou conhecida como Rainha Tereza em alguns registros históricos.
Em 1922, o dia 25 de julho foi instituído como o dia da Mulher Afro-latinoamericana e caribenha. No Brasil, a data só foi oficializada em 2014 e se transformou no Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.
Antonieta de Barros
Jornalista, fundadora e diretora do jornal “A Semana”, foi a primeira mulher negra eleita deputada federal no Brasil. Nasceu em 1901 e enfrentou inúmeras dificuldades para conquistar espaços que na época não eram ocupados por mulheres, encontrou mais dificuldades ainda por ser negra.
Começou a trabalhar como jornalista em 1920, também foi educadora, além de fundadora do Curso Antonieta de Barros, o qual dirigiu até 1952, ano de sua morte.
Carolina Maria de Jesus
Autora do best seller “Quarto de Despejo – Diário de uma Favelada” em 1960, morou a maior parte de sua vida na favela do Canindé, em São Paulo. Sua obra, assim que lançada, vendeu 10 mil cópias em cerca de uma semana, foi traduzida em mais de duas dezenas de línguas e vendida em mais de 40 países. Apesar de sua obra ser reconhecida mundialmente, muitos brasileiros desconhecem.
Antes de se tornar uma notória escritora, trabalhou como catadora de lixo para criar sozinha seus três filhos.
Maria Firmina dos Reis
Maria Firmina dos Reis nasceu em São Luís do Maranhão, em 11 de outubro de 1825, “filha natural” da escrava alforriada Leonor Felippa dos Reis, tendo como avó a também escrava alforriada Engrácia Romana da Paixão. Em 1847, é aprovada em concurso público para a Cadeira de Instrução Primária na vila de São José de Guimarães, no município de Viamão, situado no continente e separado da capital pela baía de São Marcos. Segundo Morais Filho, ao se aposentar, no início da década de 1880, a autora funda, na localidade de Maçaricó, a primeira escola mista e gratuita do Maranhão e uma das primeiras do país. O feito causou grande repercussão na época e por isso foi a professora obrigada a suspender as atividades depois de dois anos e meio. A professora foi presença constante na imprensa local, publicando poesia, ficção, crônicas e até enigmas e charadas. Além disso, teve participação relevante como cidadã e intelectual ao longo dos noventa e dois anos de uma vida dedicada a ler, escrever, pesquisar e ensinar. Atuou como folclorista, na recolha e preservação de textos da cultura e da literatura oral e também como compositora, sendo responsável, inclusive, pela composição de um hino em louvor à abolição da escravatura. Firmina é autora de Úrsula, publicado em 1859. Livro revolucionário para o seu tempo, figura como o primeiro romance abolicionista de autoria feminina da língua portuguesa. Defensora da abolição, em 1887 publica na imprensa o conto “A escrava”, texto abolicionista empenhado em se inserir como peça retórica no debate então vivido no país em torno da abolição do regime servil. Maria Firmina dos Reis faleceu aos noventa e dois anos, em 11 de novembro de 1917, pobre e cega, no município de Guimarães.
Lélia Gonzalez
Lélia dedicou sua vida à luta das mulheres negras no Brasil e é considerada atualmente um dos grandes nomes do movimento negro no país. Graduada em história e filosofia, lecionou na rede pública de ensino e deu aula de Antropologia e Cultura Popular Brasileira na PUC-RJ. Lélia fez parte do Instituto de Pesquisa das culturas negras (IPCN-RJ), do Movimento Negro Unificado (MNU) e do Nzinga Coletivo de Mulheres Negras. É autora das obras Festas populares no Brasil, premiado na feira de Frankfurt, e Lugar de negro. Criou o conceito de Amefricanidade, que trata da questão fundante da América e do Caribe a partir da África.
Sueli Carneiro
Doutora em filosofia pela USP, foi a única negra no curso de graduação da Universidade, na década de 1970. Atualmente, Sueli é uma das mais importantes pesquisadoras sobre feminismo negro do país. Seu nome e história foram relacionados à formulação da política de cotas e à lei antirracismo.
Fundadora do Geledés – Instituto da Mulher Negra, uma das maiores organizações políticas de mulheres negras contra o racismo e sexismo, além disso fornece assistência jurídica gratuita a vítimas de discriminação racial e violência sexual. É ganhadora dos prêmios Benedito Galvão, Prêmio Direitos Humanos da República Francesa e Prêmio Bertha Lutz.
Redação PNB (pesquisas em sites variados)