“Então, que dizer a vocês: Luisas e Luanas? Hoje é um dia estranho. Tão estranho como a maneira que resolvi de falar sobre isso, esse modelo “carta” tão absolutamente ultrapassado nesses tempos internéticos. Engraçado isso… vocês imaginam que minha “internet” eram os correios? Era através de cartas de amigos que moravam em outras províncias que eu e (quase) todos sabíamos do que nos interessava: bandas de rock, quem estava com quem, se chovia ou fazia sol lá onde não podíamos ver. Tinha um encanto isso, sabiam? Não vendo, imaginávamos. E a imaginação será sempre a mola propulsora que levam os sonhos ao patamar da realidade (ou não).
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ah senhora imaginação… imagina & ação.
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escrevo essa “quase” carta para dizer a vocês que o tempo que se avizinha é esquisito. Poderia até dizer tenebroso, mas não quero assustá-las, antes alertá-las. Mas tenham fé nos seus sonhos, acreditem neles, façam-nos virar realidade. Estudem muito & aprendam tudo que puderem sobre tudo e sobre nada, tempo virá que será preciso reconstruir, e essa responsabilidade será de vocês. Todas.
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eu nasci em 1965, faz tempo né? Nem tanto! A ditadura militar nasceu só um ano antes, e a famigerada globo nasceu no mesmo ano que eu. Nesses 50 anos sombras de fardas e mídia envenenadora foram a tônica & o tempero de quase tudo que aconteceu aqui. Exemplos? Presidentes salvadores da pátria & transgênicos & religiosos ocupando cargos públicos & racismo explícito e implícito & sexismo & negação de direitos de gays, lesbicas, negros, índios… os ingredientes nem mudam muito, o que muda (e aí cabe a responsabilidade de cada uma de vocês) é a maneira como as pessoas interagem com esses acontecimentos. Então se informem, sempre! E fiquem indignadas quando for necessário, a indignação é legítima! Lembrem sempre de treinar o olhar, para aprender a perceber que o favelado, o indigente na maca do hospital, o viciado, o pedinte, o desempregado, tem tanto direito a ficar indignados como vocês. Esse país gigante onde moramos não rata todo mundo da mesma maneira. Se já foi pior? Foi sim. Muito. E o medo, meu, é que volte a ser. Eu sei que vocês também têm medo, mas não deixem que o medo atrapalhe seu caminho. Eles, os que moram na casa grande em cima da colina, que tem cachorros “policiais” sob seu comando, que ensinam aos seus filhos: “para meus amigos, tudo. Para meus inimigos, a lei!”, eles também têm medo. Eles também têm medo, acreditem.
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lembrem de não votar, nunca! Vocês são o futuro, e no futuro não cabem essas aves de rapina que sobrevoam nosso país. Lembrem de ler poesia, e ouvir canções, e se admirar com o por do sol. Lembrem de sorrir e nunca, mas nunca mesmo, esqueçam que “o preço da liberdade é a eterna vigilância. Tenham um bom dia Luisas, Luanas, Anas, Franciscas, Marias, Sibelles, Anandas, Terezas & todas as meninas de qualquer idade. A anarquia? É feminina. A liberdade? É feminina. A história? É feminina. Façam isso valer!
um beijo, e a luta? Não vai parar nunca. Até a vitória.”
Lupeu Lacerda é escritor, artesão e vice versa. apaixonado por plantas, cerveja & encrenca. já escreveu livros, fez filhas e plantou árvores. gosta de moto, de galeano e de manoel de barros. obs. misture tudo, e beba quente.